São Paulo (AUN - USP) - Em um corredor do Instituto de Geociências da USP (IGc) está localizada a Oficina de Réplicas (OR), fundada há dez anos pelo paleontólogo Luiz Eduardo Anelli. Em duas salas, quatro funcionários trabalham com moldes de fósseis. Um cheiro característico de laboratório denuncia uma substância estranha, é silicone, material usado para produzir as 27 réplicas vendidas pela oficina. “Antes usávamos gesso, mas resina é mais apropriado” – e também oito vezes mais caro – explica Anelli, que é diretor da comissão de Cultura e Extensão do IGc. A OR pretende diminuir o comércio ilegal de fósseis que é muito comum no Brasil.
Em uma saleta anexa ele mostra o acúmulo de caixas de papelão – são os kits já prontos para serem despachados para as escolas. Cada kit custa R$ 890 e já foram vendidos aproximadamente 180, em média 18 por ano. A oficina somente se mantém com o lucro da venda das réplicas. Algumas são doadas para universidades, escolas e instituições públicas, a fim de disseminar o ensino de geociências. Porém, o volume de doações só não é maior devido à falta de financiamento, especialmente para contratação de mão-de-obra, relata Anelli. As coleções contêm reproduções de plantas, animais, pegadas de dinossauros e de mamíferos entre outros exemplares que, em conjunto, narram a evolução biológica do pré-cambriano ao quaternário. Algumas coleções de rochas e minerais também estão disponíveis.
Ao lado da OR duas outras salas repletas de amostras permanecem sem muita atividade. A diferença é que ali não são as réplicas, mas os fósseis de verdade que se amontoam. Estas salas servem como depósito dos objetos apreendidos pela Polícia Federal. Os fósseis - produto do contrabando do mercado negro - são descarregados na universidade para acúmulo de pó e nada mais. O professor Anelli explica que neste material ninguém pode mexer. Seja por precaução, incerteza ou ignorância, todo aquele acervo, por ordem da polícia, está fora das mãos dos pesquisadores, que não podem utilizar os fósseis – estocados na própria universidade - para fins científicos. Estima-se que a amostra de um inseto, de aproximadamente cinco cm, é comprada no Brasil por R$ 10 e vendida nos Estados Unidos por U$ 100. Um esqueleto de peixe pode custar até U$ 30 mil no exterior.
A indignação do professor é aparente. Sua vontade é achar pessoas interessadas em estudar aquele material, mas como não pode, concentra suas energias em fazer andar a oficina ao lado, mesmo diante de sucessivas crises de financiamento. Um projeto – orçado no valor de R$ 23 mil – está sob avaliação do CNPq e deve obter reposta em abril. Com este dinheiro Anelli pretende produzir uma coleção temática de réplicas da fauna e flora do geoparque do Araripe, Ceará - o único parque geológico brasileiro atualmente reconhecido pela UNESCO. Em notícia recente do caderno Ciência, Folha de S. Paulo, 30 de março, foi constatada a venda de um crânio de pterossauro brasileiro proveniente da região do Araripe. O fóssil foi está sendo comercializado pelo site americano PaleoDirect e seu valor é estimado em R$ 1,2 milhão.
“O passado em suas mãos” é o mote da Oficina de Réplicas da USP, mas não como imaginam os usurpadores de patrimônio natural brasileiro. Um trabalho realizado no geoparque convenceu Anelli de que a dispersão das réplicas pode ajudar a atenuar o comércio de fósseis. Ele ministrou um curso de reprodução em gesso de fósseis encontrados no Araripe. O turista – sedento por uma “lembrancinha” - em vez de comprar ilegalmente um fóssil, leva no lugar uma reprodução bem feita do mesmo. Isso propicia uma alternativa de renda para a população local e diminui o comércio ilegal.
Luiz Eduardo Anelli admite que sempre achou difícil como paleontólogo proporcionar um retorno à sociedade e ele frequentemente se pergunta: “como a descoberta de um crânio de dinossauro, publicada em alguma revista científica, vai melhorar a vida das pessoas?” Para ele é muito importante construir uma ponte entre a produção acadêmica da universidade e a recompensa social deste conhecimento. Seu propósito é despertar o interesse em geologia e paleontologia nas novas gerações. Disseminando de forma lúdica e ilustrativa o interesse pelas ciências naturais e quiçá ajudar a enriquecer a vida das pessoas via a educação científica.