São Paulo (AUN - USP) - O professor Orlando Zancanaro Júnior, presidente da Comissão de Descartes Laboratoriais da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP, aponta problemas na legislação que regulamenta essa área. Além disso, critica professores e alunos que não se interessam em separar, reaproveitar e neutralizar o lixo químico que produzem em suas pesquisas.
O laboratório em que trabalha desde 1996 é o pioneiro no tratamento de resíduos produzidos pela universidade. O professor, que sempre atuou na área de alimentos, diz que se interessou por esse trabalho porque ninguém mais estava disposto a fazê-lo. Depois de 12 anos, muita coisa melhorou, mas, segundo ele, falta o mais importante: a conscientização por parte dos docentes de que o gerador do resíduo é responsável por ele.
Segundo Orlando, a legislação que regulamenta o tratamento de resíduos (resoluções Conama n°358 e Anvisa n°306) não é completa, nem criteriosa. Não existe um sistema adequado para os resíduos produzidos em universidades. Não há, tampouco, fiscalização por parte dos órgãos ambientais responsáveis. E, infelizmente, não é possível depender apenas da boa vontade de empresas e laboratórios. O ideal seria que todo fornecedor especificasse qual o tratamento adequado de cada substância que produz. E que cada laboratório tivesse como uma de suas atividades diárias o cuidado com seus resíduos.
Assim como o lixo doméstico não recebe a atenção que deveria – não há preocupação em separar o lixo e, quando há, muitas pessoas separam de forma errada – o resíduo dos laboratórios é considerado de pequena importância. O professor Orlando afirma que os três erres (reciclar, reutilizar e reduzir) cabem também aos resíduos laboratoriais. “Kits de substâncias fora da validade podem ser analisados e aproveitados para os laboratórios de Ensino Médio; outros componentes servem de combustível; e os sais minerais, os aminoácidos e as vitaminas vencidos podem ser aproveitados em compostagens”, explica o professor.
Além de não aproveitar as substâncias, é prática comum mandar para o incinerador os medicamentos com embalagem, bula e tudo. “Às vezes o princípio ativo é 1% do que é queimado. O resto é lixo comum, vidro, papel, plástico, que foi queimado para gerar escória, gastar energia e poluir o ar”, afirma Orlando, que dedica boa parte de seu tempo dando palestras para conscientizar técnicos de laboratório e alunos da importância do tratamento de resíduos. “Os professores são os que menos aparecem em minhas palestras”.
A universidade gera resíduos biológicos, que são tratados pela prefeitura; químicos, que são em parte tratados em laboratórios como o do professor Orlando; radioativos, que são levados para o Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares); lixo comum e perfurocortante. No laboratório, é possível neutralizar ácidos, bases, oxidantes, redutores, entre outras substâncias. O professor utiliza, sempre que possível, um resíduo para neutralizar outro; ácidos e bases que seriam descartados se anulam quando misturados. Depois de neutralizados, ou seja, transformados em sais, eles são adicionados em composteiras, que adubam o solo. Quando as substâncias estão misturadas ou não há possibilidade de tratamento, elas são mandadas para empresas como Clariant e Saniplan, que as depositam em aterros químicos, incineram-nas ou as aproveitam como combustível para fornos de cimento.
Existe também uma preocupação social que envolve o tratamento de lixo. O Brasil produz 200 mil toneladas de lixo por dia, o que geraria, segundo o professor, cinco milhões de emprego para tratar apenas do lixo comum. Para seguir as idéias do desenvolvimento sustentável, é preciso pessoas, equipamentos e produtos para tratar resíduos que pessoas, equipamentos e produtos geraram. Mas, para Orlando, até a comunidade científica é insensível às questões do meio ambiente, a não ser quando os projetos envolvem temas em voga e grande apoio financeiro. “Nós devemos servir de exemplo para os alunos e à sociedade no trato do meio ambiente. Somos responsáveis pelos resíduos que geramos; temos que nos preocupar com ele”.