ISSN 2359-5191

21/07/2008 - Ano: 41 - Edição Nº: 75 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Governo Lula amplia a hegemonia do pensamento neoliberal

São Paulo (AUN - USP) - Apesar das pesadas críticas que Lula destinava ao neoliberal FHC, seu governo não só seguiu as mesmas bases políticas e econômicas do anterior, como ajudou a disseminar em amplos setores da população a idéia de que cabe ao mercado, e não à esfera pública, regular os conflitos de interesse e satisfazer as demandas sociais. Essa é a opinião do cientista político Carlos Alberto Bello, que em palestra na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP apresentou sua análise sobre o avanço no Brasil do neoliberalismo no Brasil, que deve se tornar um projeto mais profundo de pesquisa.

No final dos anos 80 vivia-se uma profunda crise econômica, o que aliado à luta pela redemocratização do país, impulsionada pelos sindicatos e movimentos sociais, colocava o anseio por mudanças sociais progressistas na agenda política. Os setores mais conservadores não conseguiam formular propostas de mudanças, o que levou à eleição em 1989 de um candidato com o perfil de salvador da pátria, distante de um desacreditado centro político. Apesar do programa neoliberal não estar vinculado a candidatura de Collor, já existia em suas propostas a rejeição ao estado, o elemento antipúblico.

Já quando FHC assume a presidência em 1994, embalado por ter levado os créditos da derrota da inflação, há uma nítida junção de vários setores da elite no apoio ao seu governo. Identificado com a ideologia neoliberal, Bello acredita que ele tenha reunido naquele momento as condições necessárias para estabelecer uma hegemonia, de acordo com o conceito do sociólogo italiano Gramsci. Para este pensador, a hegemonia se consolida através de uma catarse, quando os interesses passam do plano econômico-corporativo (do egoísmo, da passionalidade) ao plano ético-político (dos valores, dos interesses gerais). Para isso, também é necessário que, pelo menos supostamente, todas as classes sociais estejam contempladas dentro desses interesses. O crescimento econômico conseguido após a implantação do Plano Real dava essa sensação de que o modelo seguido seria bom para todos.

Mas Bello enxerga as grandes transformações do período de modo diferente. Para ele, a partir de 1994 assistimos à debilitação da classe trabalhadora e da burguesia nacional, com um grande avanço do capital financeiro internacionalizado sobre a economia. Com poder econômico, o discurso neoliberal difundia-se cada vez mais profundamente, enfraquecendo seus contestadores. Uma das características desse discurso é o novo modo de se tratar a pobreza, enxergando-a como algo natural, implícita a estrutura da sociedade. Desse modo exclui-se a possibilidade de mudanças profundas, que pretendam eliminá-la de vez. Faz-se o possível, com os meios que se dispõe no momento.

Idéias como essa estão justamente no centro de programas sociais do governo Lula, como o Bolsa Família. Bello acredita que o atual presidente não somente abraçou o programa neoliberal, mas criou as bases para que ele estabeleça sua hegemonia de modo ainda mais duradouro. Lula seria importante para se atrair o apoio das classes mais pobres, assim como o do movimento sindical. Com uma base de sustentação popular mais bem estruturada que a de FHC, ele serviria a enraizar mais profundamente na sociedade o conformismo que, segundo o cientista político, estaria na essência do neoliberalismo brasileiro. Não restaria muito a fazer, já que cabe ao mercado, antes do estado e da sociedade civil, resolver as tensões sociais.

Sem questionar o modelo neoliberal, vemos a política brasileira reduzir-se a uma mera briga pelo poder. Para Bello, a grande política, que verdadeiramente discuta as questões nacionais, é a saída para se questionar o modelo neoliberal. Por enquanto, continuamos a enraizar na sociedade o modelo estabelecido, pelo menos até que uma crise financeira, como a que em 1998 minou o apoio a FHC, venha a derrubar a popularidade de Lula.

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