São Paulo (AUN - USP) -A imigração dos sírios-libaneses não aconteceu devido a fatores econômicos, ou tentativa de se lançar à sorte, por impossibilidade de viver na terra natal. A vinda (e ida, como explicou) dessa população tem a ver com o que chamou de projeto familiar. E prova disso são as grandes remessas de dinheiro que voltavam, além de enviar filhos para se casar com parentes que tinham ficado, como era costume na colônia. Isso foi colocado pelo professor da UFSCAR Oswaldo Mario Serra Truzzi, autor de diversos livros e estudos sobre a população emigrada sírio-libanesa, esteve recentemente na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, para ministrar a primeira palestra da Semana de Estudos Árabes.
Sob o tema Inserção e Mobilidade de Sírios e Libaneses em São Paulo, há anos pesquisando essa população no Brasil e no Oriente Médio, Truzzi baseou-se no livro Patrícios: Sírios e Libaneses Em São Paulo para falar à platéia que lotou a sala 260 do prédio da Letras. Organizada pelo programa de Pós Graduação em Língua, Literatura e Cultura Árabe, além de palestras, foi também programação da Semana a comunicação de pós-graduandos sobre seus projetos de pesquisas, além de exibição de filme e lançamento de revista.
Uma das primeiras características emitidas pelo professor já surpreendeu quem esperava se deparar com mais uma história de sofrimento e desajuste às graúras impostas pelo ambiente e a saga da adaptação. É característica dos povos emigrados canalizar todos os esforços para construir um novo país no novo local, porém os imigrantes se preocupavam em construir uma imagem nos países - que não haviam abandonado. Truzzi contou das muitas mansões vazias que encontrou em uma viagem que fez ao Líbano, construídas à distância após a vinda para o Brasil.
A adaptação no país tem pontos em comum com a de outras etnias, como os clubes formados para a interação, ou a ascensão social - judeus, japoneses. Os sírios-libaneses não vieram com subsídios do governo, como os colonos italianos que vinham trabalhar nas fazendas. Sua imigração tem a característica de ser intensamente urbana, ao contrário dos japoneses, por exemplo. Pois não viam no colonato uma boa forma de enriquecer, afinal não se era dono do meio de produção. Preferiam então, começar pequenos mas autônomos. Por isso a imagem de mascate tão relacionada à eles. Não se concentrando na capital, iam vender pequenas mercadorias por todo o estado, e conforme conseguiam dinheiro, expandiam. Logo, qualquer cidade do interior tinha a loja de algum "turco" - na época, Síria e Líbano estavam sob domínio do Império Turco-Otomano, então todos os passaportes eram emitidos por eles: daí a confusão de nomes. Mais tarde, a elite usaria essa origem simples para construir sua identidade de grupo. Ao invés de rejeitar o início mascate, eles resgatariam esse símbolo para justificarem seu império econômico e político, de raízes honestas e de coragem empreendedora.
Essa população conseguiu um êxito incomum na vida política do país, e conquistou cargos importantes que precisavam de apoio popular além da colônia. Para o antropólogo, para se legitimarem politicamente, foi essencial a conquista do ensino superior por parte dos filhos dos imigrantes. Não basta ter dinheiro, tem que ser "doutor". Truzzi citou a Politécnica, a Faculdade de Medicina e a San Francisco como principais instituições aonde os herdeiros iam ganhar prestígio. Mas por que então os judeus não conseguiram se lançar também, sendo as duas colônias fechadas e conservadoras dos costumes? Truzzi explica isso a partir do desprendimento dos sírios-libaneses pela capital: os primeiros cargos eram no interior do estado, e a partir disso disputavam cargos nacionais. A população judaica cresceu basicamente nas grandes cidades.