São Paulo (AUN - USP) -O álcool é uma droga social por excelência. Não há uma roda de amigos assistindo a um jogo de futebol que não envolva ao menos uma lata de cerveja. Os efeitos desta aceitação popular, no entanto, não são tão divertidos. Entre 10 e 12% da população mundial e 11,2% dos habitantes das 107 maiores cidades brasileiras são dependentes do etanol, acarretando sérias conseqüências, como aumento dos acidentes e mortes de trânsito e problemas domiciliares.
A legislação para a regulamentação do consumo do álcool, entretanto, não colabora para a melhoria da situação. Um levantamento do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas revela que 65% dos estudantes do Ensino Fundamental e o Ensino Médio são usuários das bebidas, a maioria menor de idade. O problema, porém, começa mais cedo, mais precisamente antes da criança atingir a adolescência, no período em que o jovem começa sua transição para o mundo adulto, entre os 10 e os 12 anos, quando 50% dos entrevistados admitiram terem iniciado o uso do etanol.
Em palestra no Museu de Anatomia Humana da USP, o médico do Hospital Universitário da USP, João Paulo Becker Lotufo, revelou que a bebida alcoólica é a principal causa dos acidentes de trânsito, resultando em aproximadamente 60% do total. Configura-se, também, como um risco no trabalho, uma vez que contribui com 54% do total dos acidentes de trabalho, além de estar presente em cerca 80% das ocorrências policiais envolvendo violência.
O problema ainda se estende para a vida particular do consumidor assíduo do etanol. De acordo com Lotufo, o álcool é uma das principais causas dos pedidos de divórcio, com 20% do número total. E, além disso, como depressor do sistema nervoso, pode levar o usuário a atitudes graves e impensadas. Um exemplo é que 25% dos suicídios são causados pela bebida.
O médico ainda pôde mostrar que o alcoolismo, que é considerado doença, possui quatro fases de progressivo dano ao organismo. As duas primeiras são quase inofensivas, quando o uso da substância é meramente social, com dependência emocional. Na primeira, a pessoa bebe apenas socialmente, mas começa a apresentar ligeiras mudanças de comportamento, que, em geral, são relevadas pelo fato de esta fase se dar na adolescência. Na segunda, começa a ingerir mais álcool, por adquirir maior tolerância à substância, mas ainda sem grandes danos ao corpo.
As duas fases seguintes, no entanto, começam a se apresentar como um problema. Na terceira, o usuário desenvolve dependência física do etanol, além de uma altíssima tolerância à substância, além de um progressivo abandono do trabalho e de ter dificuldade para se relacionar. Na quarta fase, iniciam-se as dificuldades clínicas, como emagrecimento, cirrose, convulsões, hemorragias, além do atrofiamento cerebral. Nesta última fase há poucas esperanças de recuperação.
O médico, porém, não condena o uso moderado do álcool, desde que os outros sejam respeitados. “Ninguém está falando que não se pode beber. Apenas não dirija depois de beber”, afirma Lotufo.