São Paulo (AUN - USP) -Nunca antes na história mundial Brasil e África estiveram tão próximos comercial e diplomaticamente. Essa é a principal conclusão à qual chega Claudio Oliveira da Costa com sua tese de doutoramento “Relações político-comerciais Brasil-África (1985-2006) defendida recentemente no Departamento de Ciência Política na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Após um vácuo de duas décadas tanto no âmbito comercial quanto diplomático e um período de relações ambíguas durante o governo FHC, a agenda com relação ao continente africano se intensificou com o governo Lula.
No entanto, segundo Costa, a mudança não foi de direcionamento político, mas de “intensificação das relações”. O que permitiu essa volta do olhar brasileiro ao continente, que foi uma das fontes que constituem hoje a população e por conseqüência a própria cultura do povo brasileiro, foi o processo de redemocratização pela qual passou nosso país. “O retorno da democracia e as transformações registradas no plano internacional condicionaram sensivelmente a política externa brasileira, que passou a trabalhar na construção de uma nova identidade e visão internacionais”.
O governo Sarney é apontado pela pesquisa como o responsável não somente por ter colocado a África em segundo plano de importância nas relações internacionais como inclusive restringiu a presença nacional em solos africanos. O governo subseqüente também não expressou grandes simpatias com os países daquele continente. Num período histórico de hegemonia do capital norte-americano, globalização passou a significar, principalmente para os países subdesenvolvidos, manter relações comerciais com os Estados Unidos. Segundo Costa, as prioridades para o Itamaraty até então não incluía a África. “Houve uma nítida concentração de esforços diplomáticos para o estabelecimento de vínculos mais estreitos e sólidos com os EUA, com o bloco europeu, e com países da América do Sul”, afirma o especialista.
Em sua tese, Costa ainda analisa o porquê desse descaso histórico. Segundo ele, a visão que prevalecia era a de que as economias africanas eram deficitárias e, por isso, não valeria a pena manter relações comerciais com elas. Essa lógica manteve-se durante os dois mandatos do governo Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), quando, como lembra o cientista político, houve inclusive um retrocesso com o fechamento de postos e embaixadas de países africanos no Brasil, numa política clara de priorizar e investir nas relações com os vizinhos sul-americanos e com as economias mais avançadas no norte. A única exceção desse período foi a Nigéria, que tem afinidade lingüística, assim como ocorreu no período com outros países de língua portuguesa.
Apenas no governo Lula que a África entrou na agenda diplomática e comercial brasileiras. Começou-se a inverter a prioridade nas relações comerciais e aumentaram os acordos e as trocas comerciais entre os países africanos e o nosso, descentralizando o poder comercial e a lógica da globalização neoliberal do eixo norte-sul para a integração sul-sul. “A política externa do novo governo foi um dos setores que melhor refletiu as posições tradicionais do PT, pois o discurso e a prática diplomática convergem para construção de alianças preferenciais com parceiros no âmbito das relações Sul-Sul”, ressalta Costa. Conforme aponta sua tese de Doutorado, foi nesse período em que a iniciativa privada brasileira mais investiu no continente africano.
Os setores mais pujantes nessas relações são as áreas energética e de serviços, em que o Brasil tem grande potencial de crescimento e expansão externa. No entanto, Costa defende que é preciso considerar as necessidade e possibilidades dos parceiros para que as relações não sejam unilaterais. Para ele, “necessita definir os vetores capazes de articular os interesses nacionais às possibilidades e interesses definidos pelos estados africanos”.