ISSN 2359-5191

06/06/2009 - Ano: 42 - Edição Nº: 27 - Educação - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Bônus salarial tira liberdade de professores da rede pública
Lisete Arelaro, professora da Faculdade de Educação da USP, fala da importância da flexibilidade nos programas de ensino público e da sua conexão com o bônus salarial oferecido pelo estado

São Paulo (AUN - USP) - A política educacional do governo foi severamente criticada pela pesquisadora Lisete Arelaro, da Faculdade de Educação da USP, em mesa-redonda da Semana de Ciências Socias da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Sua principal reclamação é a respeito do bônus salarial que será oferecido aos professores da rede municipal a partir de 2010 conforme o desempenho dos alunos. Segundo ela, o bônus é uma forma de impor obediência aos profissionais e tira a liberdade garantida pela Constituição de cada um empregar seu projeto pedagógico.

O bônus, disse Arelaro, está diretamente relacionado à imposição governamental de um currículo mínimo e um programa de conteúdo para as aulas. Na lógica do governo, o currículo padrão aumenta as chances de resposta correta dos alunos nas provas, e o desempenho destes pauta a distribuição do bônus. Em oposição, a pesquisadora aponta a importância da liberdade de cada professor em adequar o conteúdo de aula à necessidade de cada turma de alunos. “Não existe teoria de currículo que diga a melhor forma de trabalhar matemática”, disse.

“Os instrumentos da reflexão não estão no conhecimento em si, mas na maneira como se trabalha este conhecimento”, refletiu. Para ela, o conteúdo escolar só se torna instrumento de emancipação intelectual quando cada aluno defende e cria seu ponto de vista. Por isso é importante o diálogo entre professor e aluno e a flexibilização do currículo conforme o desenvolvimento da classe, dos novos pontos de vista e dúvidas que surgem.

Ampliando a discussão, a pesquisadora inseriu no debate o conceito de gestão democrática. Este é um tipo de administração no qual as decisões escolares são tomadas de forma ampla e não-hierarquizada. “Na relação professor e aluno, a opinião de um e outro devem pesar na decisão da continuidade e no estabelecimento de um determinado programa de ensino”, postulou. A gestão democrática é um conceito administrativo extensível a toda a comunidade escolar, no qual professores, estudantes, funcionários, pais ou responsáveis podem opinar e interferir nas diretrizes do estabelecimento. “Perguntamos muito pouco ao cidadão brasileiro o que ele gostaria e esperaria das suas escolas”, disse ela.

O grupo de pesquisadores do qual Arelaro faz parte crê na necessidade desse tipo de gestão para a democratização do ensino com qualidade. Segundo ela, ampliar o número de vagas em escolas públicas é necessário, mas acompanhado de um incremento qualitativo. A gestão democrática pode melhorar o ensino pois faz a própria comunidade fiscalizar a escola e exigir sua transparência administrativa.

A pesquisadora ainda expôs as reivindicações dos professores nos protestos recentes da categoria contra a política educacional. “Professor não é anjo, é ser humano”, disse, referindo-se à exigência de que os professores estejam sempre sorrindo enquanto enfrentam sobrecarga horária e baixos salários. “O professor decididamente é incompetente e impermeável à inovação”, ironizou ao reproduzir o discurso dos jornais. Estes não levariam em consideração as más condições de trabalho quando criticam a escola pública.

Adelaro finalizou seu discurso relacionando o ensino à distância (UNIVESP) com a precarização da educação. O governo não acreditaria mais na sua capacidade de ampliar vagas e qualidade simultaneamente. “Já que o ensino presencial não dá certo mesmo, o governo faz a escola à distância”, concluiu.

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