São Paulo (AUN - USP) - A taxa de homicídios na cidade do Rio de Janeiro é quatro vezes mais alta que a média mundial de homicídios e duas vezes maior do que a taxa nacional, representando 62 mil mortes ao longo de dez anos, afirma pesquisa do professor da USP Leandro Piquet Carneiro. O montante do número de vítimas na cidade equivaleria, em número de habitantes, a 42,6 mortos para cada 100 mil habitantes.
De acordo com Carneiro, que leciona no Departamento de Ciências Políticas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e atua junto à prefeitura do Rio de Janeiro na área de segurança pública, a existência de grupos armados com controle de território é uma característica exclusiva da capital fluminense. Outras cidades sul-americanas como Cali e Medelín, famosas por seus cartéis de drogas e pelo excesso de violência, conseguiram desestruturar o crime organizado.
Dada a distância do Rio de Janeiro dos pólos produtores e da rota do transporte da droga, a pesquisa de Carneiro supõe que os motivos para a organização do crime na cidade sejam a união de um sistema de justiça criminal despreparado com resquícios de políticas populistas anti-penalistas. Além desses fatores, o professor aponta o baixo consumo de drogas pelos cariocas, em comparação com outras capitais onde o consumo é maior, como São Paulo e Florianópolis, e o aumento das taxas de envelhecimento e de renda per capita no Estado para justificar sua posição.
Segundo o professor, os salários dos policiais no Rio de Janeiro são baixos, equivalendo um terço do salário de um policial em São Paulo e 35% dos integrantes da Polícia Militar do Rio de Janeiro estão afastados ou acumulam mais de um emprego. A razão encarcerados/número de homicídios também é baixa, sendo presas em média 4,8 pessoas para o número de assassinatos a cada 100 mil habitantes. Em São Paulo, para se ter idéia, essa razão é mais do que o triplo, chegando a 15 presos para cada 100 mil habitantes.
Sob o ponto de vista político, Carneiro afirma que o governo de Leonel Brizola, em ambos os mandatos de 1983 e 1990, “limitou as intervenções policiais nas favelas no momento em que o crime organizado dava saltos de organização e a cocaína explodia enquanto droga popular”, apostando no caráter social do recrudescimento da violência desvinculado de ações coercitivas por parte da polícia.
Unidades de polícia pacificadora
Em seu trabalho junto à prefeitura do Rio, Carneiro está por trás do desenvolvimento das chamadas unidades de polícia pacificadora (UPP). A proposta é a recuperação das áreas controladas pelo crime na cidade e a instalação de bases da polícia nessas comunidades, em um engajamento maior com a população local. “A promessa do programa é a simplicidade e inovação, não ser tolerante a qualquer forma de crime” afirma.
Para tanto, as UPPs investem na reestruturação da polícia e na ampliação da capacidade de liderança dentro do sistema judiciário através de políticas de metas e de mecanismos indutores de desempenho. O ponto polêmico do projeto encontra-se no método de recuperação das áreas controladas pelo crime organizado: a utilização da tropa de choque e do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope).
Atualmente existem cinco UPPs instaladas em comunidades do Rio de Janeiro e o projeto vai até o fim do mandato do governador Sérgio Cabral. A meta para 2009 é atingir 12% de queda no número de homicídios na cidade.
São Paulo e Rio de Janeiro
Em sua pesquisa, Carneiro compara o estado de São Paulo com o estado do Rio, a título de compreender o recrudescimento da violência em São Paulo após 1999 e a evolução da violência no Rio.
Entre 1991 e 1998, a taxa de homicídios na cidade de São Paulo era pior do que a média nacional e, caso a cidade tivesse acompanhado o ritmo de crescimento da violência nacional, São Paulo hoje teria quase 50 vítimas de homicídio a cada 100 mil habitantes. Entretanto, a partir de 1999, houve uma queda da violência na capital paulista de aproximadamente 50% quando comparada ao período anterior, representando uma economia de 28 mil vidas.
Atualmente a taxa de homicídios na cidade encontra-se abaixo da média nacional e o estado de São Paulo está quase alcançando índices de países como os Estados Unidos no número de homicídios. “Em 2009, a taxa de homicídios do estado de São Paulo ficará muito próxima à média mundial, o que é uma conquista fantástica para o País”, anuncia o professor.
Na explicação dessa diferença entre os dois estados no mesmo período de tempo, Carneiro afirma que a resposta está no maior grau de institucionalização do estado de São Paulo, na existência de políticas públicas para a capital e de um aparato policial melhor preparado. No entanto, o professor não atribui o desempenho paulista a algum político: “não foi uma política específica, nenhum político conseguiu se apropriar desse resultado positivo, em São Paulo há mais institucionalização, sem comparações com o Rio de Janeiro”.