São Paulo (AUN - USP) - O ciclo de palestras “Direito à Memória”, mensalmente realizadas no bairro de Perus desde março de 2009, é resultado da conjugação de esforços de alunos de pós-graduação, professores, membros do PET (Programa de Educação Tutorial), iniciativa que apóia atividades de iniciação cientifica e extensão, dentre outras entidades como o cursinho e o sindicato locais.
O núcleo temático deste primeiro ciclo de palestras gira em torno à reflexão sobre a inserção do bairro no período da Ditadura Militar. Dois episódios foram marcantes para o bairro de Perus neste período: o primeiro é a greve dos trabalhadores da fábrica de cimento local que foi a mais longa do período, durou sete anos, de 61 a 68, e só teve fim com o recrudescimento do regime advindo do AI-5. Há ainda muitos remanescentes dessa época, que fazem parte do sindicato e que são conhecidos como “queixadas”, alguns dos quais participaram ativamente das palestras dando depoimentos.
Além disso, a vala comum de Perus, trazida a público no inicio da década de 90, onde foram enterrados diversos presos políticos e também presos comuns, assassinados sumariamente pela polícia, foi tombada e tornou-se emblemática na luta contra as violações aos direitos humanos.
Estes foram temas recorrentes nas palestras. O professor Edson Telles, da Uniban (Universidade Bandeirante de São Paulo), que teve pai e mãe presos e torturados, falou sobre o tombamento da vala, do período de redemocratização no Brasil e na África do Sul e fez uma análise do que chamou de “resquícios da ditadura”, as torturas e humilhações que subsistem ainda nas cadeias e Febens. Falaram, ainda sobre o assunto vários docentes da USP, o professor Ivan Seixa, que foi preso e torturado, e teve o pai enterrado no cemitério de Perus, o professor Leonel Itaussu das Ciências Sociais, também ex-preso-político e a professora da Faculdade de Educação, Maria Vitória Benevides, que falou de maneira mais geral sobre o período da ditadura.
Houve também temas levantados pela própria comunidade como é o caso da palestra sobre meio ambiente e urbanização feita pelo professor da Faculdade de Geografia, Francisco Scarlato, e da palestra sobre produção artística na periferia feita pela professora Rose Satiko, do Departamento de Antropologia, que exibiu seu documentário “cinema de quebrada” e fechou o ciclo deste ano.
A região não tem universidade, nem pública nem particular, e o sonho da comunidade é conseguir desapropriar a fábrica, tombada na gestão da professora Marilena Chauí, também escalada como palestrante, mas que não pode comparecer, e tentar construir um Museu da Historia do Trabalhador ou Centro de Cultura do Trabalhador e uma universidade gratuita. O Público, bastante heterogêneo, é composto de professores da rede pública, dois dos quais são diretores de escola, alunos do cursinho popular, integrantes do sindicato e lideres comunitários. O curso pertencente à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP dará certificado aos participantes numa solenidade prevista para dezembro.
Realização do projeto
Dentre os principais realizadores do projeto, está o pós-graduando Wilson Sparvoli, responsável pela iniciativa e pelo convite aos professores palestrantes. Segundo ele, o projeto começou com o Jardim Miriam, também um ciclo palestras feitas por professores da USP num bairro periférico de São Paulo. As palestras eram feitas numa ONG, sediada no ateliê da artista plástica Mônica Nadaro e também foram patrocinadas pelo PET.
Segundo Sparvoli, sempre houve o apoio da faculdade, principalmente do Departamento de Filosofia, mas em dado momento eles decidiram buscar apoio fora por meio de editais e projetos, o VAI da prefeitura de SP e o PROEST do MEC, e encaminharam um projeto que acabou chegando nas mãos do Assistente Acadêmico Clovis, morador de Perus, e quem deu a idéia de levar o projeto ao bairro.
O projeto, além do auxilio do departamento com infra-estrutura (papel, telefone, fax,etc), recebeu uma verba de R$ 3 mil por meio do Fundo de Cultura e Extensão, e conta ainda com o apoio de uma ONG holandesa que os auxilia através do Projeto Coruja. Do PET, a contribuição é principalmente sob a forma de capital humano.
O projeto deve ter continuidade em 2010, e os planos são de abordar a temática da Educação.