São Paulo (AUN - USP) - O Centro de Memória da Faculdade de Educação (FE) da USP concluiu, recentemente, a organização e catalogação do arquivo João Penteado, um dos acervos mais importantes sobre educação anarquista no Brasil. Datado do começo do século, o acervo engloba jornais dos grêmios estudantis, cartões postais, imagens e manuscritos preciosos.
O pedagogo João de Camargo Penteado foi professor e diretor da Escola Moderna n° 1, fundada em 1912 em São Paulo, no bairro do Belenzinho, e extinguida em 1918, por ordem do governo da época. O colégio fugia bastante do conceito de educação tradicional, e já seria inovador se existisse nos dias de hoje: a autoridade do diretor-professor era mínima, as aulas eram baseadas nos conceitos de solidariedade e formação do caráter moral dos alunos e não existiam provas para não estimular a competição. Ao invés disso, os trabalhos dos alunos eram sempre publicados no jornal da escola e em boletins informativos, que também avisavam sobre as atividades libertárias e anarquistas desenvolvidas dentro e fora do prédio escolar. Passeios pela cidade eram comuns, para incentivar os alunos a perceberem criticamente os problemas sociais da época.
A pesquisadora do Centro de Memória e professora docente da Faculdade de Educação, Cecília Hanna Mate, se interessou de imediato pelo projeto, segundo ela, pela rebeldia e ineditismo do modelo anarquista de educação no Brasil. “Os princípios dele eram o não-autoritarismo, não-igreja, não-poder”, explica. Cecília conta que a família de João Penteado entrou em contato com o Centro de Memória em 2007 pedindo ajuda para resgatar o arquivo, que estava abandonado no prédio da escola. “Você não faz ideia das coisas que nós encontramos, como elas estavam se desfazendo e da preciosidade desses documentos”, comenta. Com o trabalho finalizado, o arquivo estará disponível para outros pesquisadores, que poderão utilizar as informações para explorar o conceito de educação anarquista. A professora está confiante: “Por conta das próprias relações de poder da época, a memória da educação anarquista ficou meio obscurecida. A partir de agora, que o arquivo está pronto, qualquer pesquisa vai poder explorá-la pelo lado que quiser”. Quando indagada sobre o futuro da educação anarquista no Brasil, a pesquisadora pondera: “Hoje, acho possível sim uma escola anarquista, mas não nos mesmos moldes da Escola Moderna n° 1. Mas sim com os princípios do anarquismo”.