São Paulo (AUN - USP) - Imagine a emoção de tocar partituras que estavam perdidas. Foi o que sentiram os alunos Rodrigo Augusto Baéz Rojas, Nicolás Ramírez Salaberry, Issac Terceros Montaño e Ronaldo A. Teles dos Santos, do Departamento de Música (CMU). Orientados pela professora Adriana Lopes Moreira, participaram do VIII Festival de Música Barroca Misiones de Chiquitos, região da Bolívia. Eles tocaram com a Orquestra Sinfônica Juvenil de Sta Cruz de La Siera, na cidade natal desse grupo, na igreja da Sagrada Família. Desse jeito, fizeram parte de um festival que resgata, revive e apresenta, há 14 anos, partituras das missões jesuíticas das regiões de Chiquitos e Moxos, escritas entre os séculos XVII e XVIII e encontradas apenas em 1970, durante a restauração de algumas igrejas.
Do dia 22 de abril a 2 de maio, a Bolívia foi palco de mais de 120 concertos, apresentados por grupos de 21 países. O Festival ressalta a “importância de manter o patrimônio vivo, sempre em exposição”, diz Ronaldo dos Santos. Cada concerto deveria trazer uma peça patrimônio resgatado das ruínas, agora objeto de estudo internacionalmente. Os planos do grupo de alunos e aventureiros do CMU são de participar, daqui a dois anos, do Festival, com grupo formado. Para isso, ainda precisam ensaiar, gravar um CD, mandar para a comissão avaliadora e passar pelo processo de seleção de concertistas.
Não apenas para o Festival serviu a viagem dos quatro alunos. Foram entrevistados por diversas rádios locais, como Fidex, Santa Cruz, Red UNO, Cadena A, entre outros. Comentaram suas atividades na USP, falaram do festival e aproveitaram para tocar. Palestraram também na Universidad Evangélica Boliviana. Falaram sobre os programas estudantis da USP e apresentaram sugestões de material e bibliografia para os alunos.
Na Oficina Escola Musiarte, fizeram um concerto didático às crianças e pais presentes. Na ocasião, músicos locais também se apresentaram. Um músico tirou som de um instrumento no mínimo inusitado: apanhou uma folha de árvore no jardim e tocou uma melodia, assoprando-a. “Foi a primeira folha que ele achou!” espanta-se Ronaldo dos Santos; “A folha nem era barroca”, ri-se Isaac Montaño.
Eles foram para o país vizinho empreender pesquisas relacionadas ao repertório de Chiquitos e ao arquivo musical de San Ignácio de Moxos. Participaram do Simpósio Internacional sobre Musicologia, onde a metodologia de catalogação do repertório foi amplamente discutida. Ele consiste em aproximadamente 5 mil partituras achadas em Chiquitos, além de 4 mil encontradas em Moxos. A criação de um banco de dados e a mudança de distinção do tom (de “tom” para “tom/modal”) foram apresentados. Um dos continuadores do projeto de catalogação do repertório Piotr Nawrot.
O grupo de alunos visitou povos jesuíticos, ainda vivos, como os das cidades de Concepción, San Xavier, Ignacio de Velazco e Santa Ana. Para esses alunos, as cidades são “patrimônio vivo, mais do que vestígios de ruínas”. As Missões de Chiquitos foram, em 1991, declaradas Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Apesar de arquitetura barroca, as igrejas têm traços da cultura indígena nos murais, nos detalhes em órgãos, nas paredes. Instrumentos de época foram usados pela maioria dos grupos. Mas alguns fizeram arranjos para instrumentos modernos, como é o caso de um grupo que, de uma partitura originalmente para quatro vozes, tocaram em metais de sopro.