São Paulo (AUN - USP) - As pragas nas plantações são um problema para os agricultores mundiais e o controle dos insetos é essencial para manter o lucro da criação. Para o Brasil, grande produtor de produtos agrícolas, a necessidade de estudos nessa área é importante. Pesquisas sobre modos alternativos ao uso de produtos químicos para controlar as pragas são feitas na Universidade de São Paulo (USP). O laboratório de Bioquímica de Insetos, coordenado pelo professor Walter Ribeiro Terra, no Instituto de Química, possui trabalhos em conjunto com outros grupos para o encontro de alvos de ataque aos insetos e uso desse conhecimento para o desenvolvimento de plantas transgênicas que produzam substâncias para se proteger das pragas.
Hoje, os defensivos químicos são a técnica mais utilizada para proteger plantações. “Eles são eficazes, funcionam bem, mas têm o problema da toxidez”, explica Walter. Outra maneira de controle é o chamado controle biológico. Ela consiste na criação de um inseto que ataque o outro inseto praga. Na cultura de cana-de-açúcar em São Paulo, é usada uma vespa que localiza o caule da cana e injeta ovos na lagarta que está lá. Quando as vespas viram adultas, a lagarta morre. “A vespa é criada com dietas artificiais. Existem organizações que, junto com os produtos de cana-de-açúcar do estado de São Paulo, bancam essa tecnologia. A economia por conta dessa vespinha é enorme”, diz o professor.
O problema da vespa é que ela não resolve a questão por completo, porque existe uma certa quantidade de escape e a cana-de-açúcar tem outras pragas que não são atacadas por ela nem possuem predadores naturais. A alternativa é o desenvolvimento de variedades de plantas resistentes a insetos. “Então, você faz cruzamentos tradicionais de genética das plantas, tentando encontrar variedades que são resistentes. Isso é eficaz, mas é uma questão de sorte”, diz Terra. Atualmente, o mais comum é a criar plantas resistentes por manipulação genética, ou seja, criar variedades transgênicas.
Segundo o pesquisador, a maneira mais fácil de atingir um inseto é pela boca. “O inseto, pelo lado de fora, é muito protegido porque tem uma carapaça dura que o envolve. Por outro lado, quando ele come, a parte interna não pode ser impermeável, se não ele não conseguiria absorver os alimentos. Então, esse é o lugar mais fácil de ser atacado”, explica Walter. A partir disso, a ideia é fazer uma planta modificada geneticamente que produza algo que afete o sistema digestivo do inseto. No corpo dos insetos, assim como no de outros animais, são produzidas enzimas digestivas que transformam alimentos em moléculas mais simples para absorção. “Se a planta produzir um inibidor dessas enzimas, quando o inseto a comer, não conseguirá fazer a digestão, ou seja, ele morre de indigestão”, explica Terra. Além das enzimas, existem outros pontos do tubo digestivo do inseto que podem ser atacados, como a membrana que reveste as células e que estão envolvidas no processo de transporte dos nutrientes absorvidos.
O trabalho no laboratório de Bioquímica de Insetos é estudar os aspectos moleculares, celulares e evolutivos da digestão nos insetos. “Como os insetos são extremamente variados, o que você aprende em um pode não servir para outro. O que fazemos é escolher insetos em pontos estratégicos na árvore evolutiva de tal forma que, conhecendo um, podemos olhar para árvore e saber as tendências das moléculas nos tubos digestivos dos próximos e os tipos de armamento que podemos usar contra ele”, explica o pesquisador. As moléculas do tubo digestivo são isoladas e se busca entender sua função. A intenção é o encontro de alvos para o combate aos insetos. “Fornecemos os alvos e os resultados estão disponíveis para quem quiser fazer esse tipo de uso [para modificação de plantas]. Estudamos mais de uma praga: tem um besouro da cana-de-açúcar, a mosca doméstica, um percevejo de algodão e uma lagarta que ataca que milho”, completa.
A criação dos transgênicos implica no conhecimento de um gene que produza uma molécula eficaz contra uma praga. O gene deve ser inserido na planta atacada e, para isso, existem várias técnicas. “Existem enzimas que cortam o DNA e permitem inserir um gene de uma outra planta ou de micro-organismos. Dá para fazer um sintético também, mas é muito mais complicado”, explica o pesquisador.
Os insetos podem se tornar resistentes às plantas transgênicas, do mesmo modo que as bactérias se tornam aos antibióticos. Por isso, as pesquisas não podem deixar de serem feitas para buscar novos alvos. “Existem coisas que podemos fazer para diminuir isso. Por exemplo, criar ilhas de plantas não-transgênicas no meio de uma plantação transgênica. Assim, você permite uma certa reprodução dos insetos que não são resistentes e não deixa que os resistentes predominem”, explica Walter.
Geralmente, as plantações possuem mais de uma praga, apesar de ter uma predominante. Para isso, é necessário o conhecimento de várias moléculas para que se afete todas as pragas. No entanto, isso pode levar à perda de eficiência da planta. “Ela perderia eficiência porque você está dirigindo as energias da planta para produzir uma coisa que fazia antes”, explica o professor. Uma pesquisa que está em andamento é o estudo de moléculas que organizam a expressão do gene para que ele só se expressa em locais determinados da planta. “Pode ter pragas que só atacam uma parte da planta, como a raiz, por exemplo. Então, ter determinado inibidor na folha é um desperdício, porque a planta está gastando energia para fazer aquilo e não tem nenhuma vantagem”, diz o pesquisador.
Outras plantas possuem um sistema natural de expressão do inibidor apenas quando estão sendo atacadas. “Quando a lagarta começa a comer a folha, os fragmentos que ela gera liberam um composto químico que avisam a planta para começar a fazer inibidor. Assim, o ataque para”, diz Walter. O ideal é que seja feito esse sistema artificial para que a planta não desperdice energia. Esse não é o foco do laboratório, mas há outros lugares, como a ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), que fazem esse tipo de estudo.