São Paulo (AUN - USP) - Algumas histórias são tão envolventes que continuam sendo contadas e reinventadas das mais diversas maneiras. Muitas delas conquistam uma série de fãs, que "completam o mosaico narrativo" deixado pelos criadores de histórias como "Guerra nas Estrelas" e "Lost" nos mais diferentes meios e plataformas. Esse processo, denominado crossmedia ou transmídia, foi tema de uma palestra apresentada recentemente na Escola de Comunicações e Artes da USP por Carlos Scolari, da Universidade Pompeu Fabra, de Barcelona.
Segundo o palestrante, as novas mídias e a digitalização possibilitaram uma maior participação do público, o qual adquiriu um duplo caráter: é ao mesmo tempo consumidor e produtor de conteúdos. Ele procura "contar aquilo que os criadores não contam", mostrando outros lados da história. Isso explicaria, em parte, a proliferação de versões, paródias e adaptações de certas narrativas. A indústria do entretenimento também colabora para a "construção global e coletiva de mundos possíveis", ao lançar produtos atrelados às histórias originais.
Mas apesar da transmidiaticidade parecer um fenômeno recente, Scolari afirma que as narrativas que se espalham por mais de um meio são bastante antigas. "O Cristianismo, por exemplo, já foi contado pela Bíblia, pela fala e pelos desenhos dos vitrais nas igrejas", diz. O crossmedia também estaria presente em produções de antes do tempo da internet, como os personagens da Disney, os quais renderam filmes, brinquedos, programas de televisão e até um parque temático.
Retornando aos dias de hoje, Carlos Scolari mostrou a manifestação desse tipo de fenômeno analisando as séries de televisão americanas "Lost" e "24 Horas", as quais tiveram suas narrativas transferidas para os mais diversos meios e produtos, tornando-se fenômenos transmidiáticos. A série "24 Horas", por exemplo, deu origem a histórias em quadrinhos, videogames, episódios para o celular, paródias e até brinquedos. "Lost", por sua vez, ganhou um grande número de adaptações, paródias e versões alternativas.
As narrativas que comportam esse tipo de criação de novas versões foram denominadas pelo pesquisador de "narrativas acordeão ou fole", já que podem ser comprimidas(em resumos ou recapitulações) ou expandidas. Segundo ele, ainda, há três maneiras de expandir uma história: contando aquilo que aconteceu antes ou depois do evento principal, mostrando acontecimentos paralelos à história central, ou explorando personagens considerados secundários na trama de origem.
Ao final da fala de Carlos Scolari, a professora de ECA-USP Maria Immacolata Vassallo de Lopes salientou que esse tipo de extrapolação de uma narrativa para diversos meios e plataformas ainda é raro no Brasil, sendo reservado a uma elite que tem condições de se juntar aos movimentos globais. Entretanto, ela vê avanços nessa área, principalmente em redes sociais e sites que discutem as telenovelas.