ISSN 2359-5191

27/04/2011 - Ano: 44 - Edição Nº: 15 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Era Meiji foi determinante para a construção da identidade japonesa

São Paulo (AUN - USP) - Filas metodicamente organizadas, disciplina e a austeridade Oriental chocaram brasileiros que assistiam os desdobramentos das recentes tragédias naturais no Japão. Em palestra ministrada no departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), o pesquisador da Universidade de Osaka, Rogério Dezem destrinchou como a imagem dos japoneses disseminada hoje no mundo foi estrategicamente construída durante a Era Meiji.

De acordo com o pesquisador, durante o período de Restauração do Imperador Meiji, no governo do Japão de 1867 à 1912 (data de sua morte), formou-se o Japão moderno: uma tradução do modo de pensar ocidental. Ou seja, os japoneses absorviam o conhecimento tecnológico do Ocidente, e não a cultura, como forma de evitar a subjugação.

Antes da Era Meiji, a maior parte da população tinha uma ideia mínima do que significava civilização e a sua validade, não sabia da existência do imperador e o próprio casamento não existia como algo associado ao Xintoísmo. Com a restauração, a nação foi projetada como extensão da família e o imperador tornou-se a “cabeça do povo”. O forte ideal de comunidade, no qual a família e o imperador são figuras essenciais, corroborou a consolidação de uma nação moderna com a ideia de homogeneidade racial.

Para se firmarem enquanto nação, construiu-se uma forte coesão política e militar, que se opunha aos vizinhos geográficos. Percebe-se assim que desde o início da construção de sua identidade, os japoneses tentaram se livrar da “ideia asiática”. Os chineses, primeiros “outros” no Japão, foram por muito tempo os únicos estrangeiros presentes no país e eram estigmatizados pela barba e pêlos no corpo. “Ainda hoje, os japoneses evitam contato físico com o outro. Ninguém senta ao meu lado no trem”, comentou Dezem, cujas características encaixam-se perfeitamente na ideia do “outro” japonês.

Sob a ótica japonesa, os ocidentais eram seres ainda em processo de desenvolvimento, mais próximos do primata. Curiosamente, para os orientais, questões físicas como nariz grande, sobrancelha peluda e lábios grossos chamam muito mais atenção do que a cor da pele, por exemplo. Enquanto no Ocidente, no início do século 20 as teorias racistas ganhavam espaço, no Japão, a construção da identidade focava na reafirmação de si, na superioridade do ethos nipônico. Os japoneses não se consideravam superiores fisicamente ou intelectualmente, porém mais valorosos, espiritualmente puros. Para eles, a moral é algo natural, não há necessidade de um código ético.

No entanto, até que ponto as elites souberam manejar os instrumentos da modernidade (tecnologia e teorias ocidentais) para criar as bases do estado-nação japonês? De acordo com Dezem, o Japão conseguiu responder ao desafio ocidental de se modernizar, mas a tarefa da identidade ficou incompleta. “No teatro das ‘raças’, não passava de mero coadjuvante, essa continua a ser uma questão em aberto perante o outro europeu.”

O estereótipo japonês de hoje
Para o professor Sedi Hirano, do Departamento de Sociologia da FFLCH, no Japão a palavra “coletivo” tem um poder muito grande. “O Ocidente gosta de satanizar, gosta de sensacionalismo. O povo japonês é um povo contido. Não se pode julgar um povo com valores que não são desse povo. Sataniza-se a hierarquia e a disciplina, mas é necessário estabelecer regras.”, comentou.

A disciplina e organização que saltam aos olhos ocidentais vêm do período Tokugawa, regime de Xogunato que precedeu a restauração. Porém foi formatada pela Era Meiji com o ensino e a contenção de revoltas, por exemplo. Mas para Dezem, a visão Ocidental também tem um pouco de mito, estereótipo. No caso das recentes catástrofes, houve forte intervenção da imprensa local, “extremamente pasteurizada”, de acordo com o pesquisador, forma de evitar o caos. “Como qualquer indivíduo, também há o deslocamento da realidade, quando a individualidade se sobrepõe a questão cultural”.

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