ISSN 2359-5191

02/05/2011 - Ano: 44 - Edição Nº: 18 - Ciência e Tecnologia - Instituto de Química
Grupo que estuda fungos luminosos busca ampliação de suas pesquisas
Ainda neste mês cientistas realizam viagem ao Piauí em busca de nova coleta de cogumelos com propriedades bioluminescentes

São Paulo (AUN - USP) - O estudo sobre seres vivos com propriedades bioluminescentes, isto é, que são capazes de emitir luz fria, é antigo e amplo. Diversas bactérias e animais, como vaga-lumes, água-vivas, mosquitos e peixes, já foram pesquisadas e inclusive observadas por Aristóteles. Contudo, estudos aprofundados sobre fungos que apresentam tal característica só são realizados no Brasil. Um grupo de cientistas do Instituto de Química da USP (IQ), liderado pelo professor Cassius V. Stevani e patrocinado pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), busca desvendar minúcias das moléculas envolvidas e aplicações práticas para o fenômeno.

Como idealizador do projeto, iniciado há 10 anos por curiosidade científica e agora reconhecido internacionalmente, Stevani viajará dentro de duas semanas para uma fazenda próxima de Teresina (PI) a fim de coletar novas amostras de cogumelos. Posteriormente, a amostra será examinada detalhadamente nos laboratórios do IQ, juntamente com outros micólogos, entre eles Marina Capelari, do Instituto de Botânica de São Paulo. O estudo conta também com a participação do professor Vadim Viviani, da UFSCar de Sorocaba, e do pós-doutor Anderson Garbuglio de Oliveira.

A pesquisa visa, sobretudo, a esclarecer certos mecanismos biológicos e químicos envolvidos nas reações luminescentes. Apesar de algumas teorias a respeito do motivo que levam os fungos a emitir a luz verde, nenhuma é comprovada. Cientistas estimam que se trata de uma proteção contra seres fotofóbicos ou, pelo contrário, de um artifício para atrair determinados animais. Este é um dos pontos misteriosos. Porém, há outros segredos em focos. É de muito interesse a descrição da composição química das enzimas responsáveis, bem como do substrato responsável pela emissão luminosa, genericamente denominado “luciferina”. “O termo deriva da palavra ‘luz’ e é utilizada para qualquer elemento que é capaz de produzir bioluminescência”, disse Stevani.

Há quatro linhagens conhecidas de fungos que se expressam neste instigante aspecto físico. Em entrevista à “Pesquisa Online”, da Fapesp, o professor Dennis Desjardin, da San Francisco State University, envolvido há anos na mesma pesquisa, esclarece que há grande possibilidade de haver muitos outros, mas que não são descobertos porque a luz emitida só é notada no escuro. “Especulo que vários dos fungos tropicais raros sejam luminescentes, mas não percebemos ainda”, arrisca Desjardin. No Brasil, os seres micológicos são encontrados principalmente no Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Petar), e em Iporanga (SP), no Piauí, Paraná Mato Grosso do Sul e em trechos na Amazônia. “Sabemos muito pouco sobre os cogumelos do Brasil, então esperamos encontrar muitas novas espécies, luminescentes ou não”, completa Desjardin. Na verdade, já eram conhecidas espécies de fungos desde 1840 pelos registros do biólogo britânico George Gardner. Porém acredita-se que a classificação feita por ele, por sinal muito parecida com a de fungos europeus, é equivocada.

Para o avanço das pesquisas será necessário, portanto, o esforço por parte dos cientistas em descobrir novos locais onde a cultura destes visados fungos se prolifera, além, claro, de preservar áreas já conhecidas. “Esse tipo de pesquisa demanda tempo e você tem que apostar”, declarou Stevani à AUN. Outro ponto importante é a pequena quantidade dos materiais no fungo passíveis de serem analisados, uma vez que 90% de sua composição seja água e apenas uma porcentagem minúscula do restante pode servir para aos laboratórios isolar as moléculas desejadas.

A viagem de Cassius Stevani ao estado do Piauí é fruto de uma descoberta não intencionada feita pela norte-americana Dorothy Fragaszy, em 2005. A pesquisadora estava no local em meio à outra jornada científica e, aleatoriamente, observou um cogumelo que brilhava na base de uma palmeira babaçu. A partir daí, alguns contatos no meio social destes cientistas foram efetuados, sendo que Stevani foi o destino final da mensagem.

Ele acredita que futuramente será possível a aplicação dos genes portadores do código da bioluminescência em outros seres eucariontes, como vegetais e até animais. Através desse procedimento, a energia luminosa será útil na indicação de funções proteicas. A técnica de engenharia genética é conhecida como Reporter Gene, ou gene repórter. A discussão no campo de evolução enzimática também poderá ganhar novos tópicos, já que as funções de enzimas muito antigas estão em questão.

Entretanto, talvez a aplicação que desperte mais interesse, pelo menos por enquanto, seja o indicador de toxidade de metais. Um dos experimentos atuais administrados pelo grupo da USP concluiu que quanto mais tóxico é o meio, menos luz os fungos emitem. A proporcionalidade pode levar à formulação de fungicidas, assim como biossensor em solos contaminados.

O estudo já rendeu artigos importantes na comunidade científica, como na Revista online Mycologia, divulgada durante o bimestre de março-abril de 2010. Mesmo após um ano de tal publicação, e depois de dois milênios das observações de Aristóteles, os fungos continuam brilhando e esperando novas descobertas, enquanto cientistas anseiem pelos desdobramentos positivos na Ciência.

Para conhecer mais:
1. Desjardin, D. et al. Luminescent Mycena: new and noteworthy species. Mycologia. no prelo.
2. Mendes, L.F. Stevani, C.V. Evaluation of metal toxicity by a modified method based on the fungus Gerronema viridilucens bioluminescence in agar medium. Environmental Toxicology and Chemistry. v. 29, p. 320-26. 2010.
3. Oliveira, A.G. e Stevani, C.V. The enzymatic nature of fungal bioluminescence. Photochemical & Photobiological Sciences. v. 8, p. 1.416-21. Out. 2009.

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