São Paulo (AUN - USP) - A briga pelo acesso aos medicamentos que poderiam salvar milhares de vidas ainda parece longe do fim. Quando o ideal seria permitir o livre comércio, o acordo internacional recentemente mediado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) ficou aquém do esperado, segundo ONGs e ativistas. Com ele, as grandes indústrias farmacêuticas garantem seus lucros no mercado mundial e países pobres não podem comprar genéricos com a urgência necessária.
A lei das patentes é em parte a "salva-guarda" das grandes indústrias. Por meio dela, os fabricantes de uma nova molécula podem registrá-la e obter a exclusividade de sua comercialização por certo período, que pode chegar a 20 anos. No entanto, alguns países, tais como a China e a Índia, não reconhecem as patentes e comercializam qualquer molécula em seu mercado interno. Esses medicamentos genéricos, também mais baratos, tiveram agora autorização da OMC para serem exportados a países pobres. Mas segundo o professor Humberto Ferraz, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP, as exigências impostas ao acordo pelos EUA impedem a eficiência na distribuição dos remédios.
"A África precisa de medicamentos para amanhã. Mas não vai conseguir, terá de passar por toda a burocracia", acredita o professor, que desde 1995 estuda a formulação de genéricos e fez doutorado em bio-equivalência. Entre os entraves do acordo, ele cita a obrigatoriedade de se provar que os produtos serão usados apenas no serviço público. "Para combater as grandes epidemias, tais como a AIDS, ideal seria permitir o livre comércio".
Já para o Brasil, onde há um dos melhores programas públicos no tratamento da AIDS, o acordo trará alguns benefícios. Segundo o professor, o governo poderá pressionar os detentores das patentes a fornecer os medicamentos por preços mais baixos. Ou seja, havendo competição no mercado, deve ser possível obtê-los diretamente das indústrias com maior rapidez.
O governo brasileiro está negociando descontos de 30 a 40% nos produtos que compõe o coquetel da AIDS. Caso obtenha sucesso, o governo atenderá uma parcela maior da população, uma vez que cerca de metade dos medicamentos do coquetel precisa ser importada.
O novo diretor -geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Lee Jong-Wook, declarou que a disponibilidade dos remédios não pode resolver o problema de epidemias nas nações pobres. "Ainda faltam médicos, enfermeiros e infra-estrutura". A OMS fez um apelo aos países-membros da OMC para que coloquem o plano em prática rapidamente, porque só assim o impacto do acordo poderá ser de fato medido.