São Paulo (AUN - USP) - Nada mais interdisciplinar do que um matemático falando sobre a guerra. Ou um dentista conversando sobre as normas da língua portuguesa. Na verdade, as possibilidades de fundir setores do conhecimento humano entre si são infinitas. E com isso, qualquer pessoa interessada só tem a ganhar. A interdisciplinaridade tem conquistado mais destaque nos dias de hoje e vem sendo encarada como método mais completo e criativo de estudo.
Além do impulso dado através das questões do Enem e de diversos vestibulares do país, as próprias profissões têm seguido esta tendência. No meio acadêmico, a história não é diferente. O Instituto de Química da USP (IQ) é um destes ambientes que incentivam a aplicação prática da multidisciplinariedade. Seguindo esta linha, alunos e professores uniram a química ao teatro e também à filosofia e à história para criar o grupo Química em Ação.
A equipe conta atualmente com 17 integrantes, sendo que orientadora teatral Letícia Melo é estudante de artes cênicas da Escola de Comunicação e Artes da USP (ECA) e Guilherme Marson é professor do Instituto e orientador.“O objetivo dos espetáculos é despertar o interesse pela química”, diz Luciene de Camargo Lima, aluna e integrante do grupo desde o ano passado. De maneira interativa e didática, as peças atuam no sentido de desmistificar o rótulo de “bicho de sete cabeças” da química. Com o bom humor da turma, esta tarefa não é difícil.
O grupo não é novato nesta arte. Fundada em 1985 pelo memorável professor Atílio Vanin, a equipe já se apresentou em Campinas, São Carlos, Curitiba, Brasília e até no Canadá alguns anos atrás. As apresentações são feitas em escolas públicas e particulares, na própria faculdade e eventos em geral.
Atualmente, o grupo ensaia três espetáculos diferentes. O mais antigo deles é “A Química das Sensações”, cujo ritmo é bastante envolvente por realizar experimentos ao vivo e solicitar participação do público. Já as peças “Química na História” e “Quimitaverna” são mais teatrais. “O nosso roteiro é colaborativo e a Letícia propõe muitos jogos durante os ensaios direcionados ao conteúdo da vez”, explica Luciene.
Especialmente por este ser o Ano Internacional da Química, o grupo contou com a novidade de se apresentar na Estação Ciência da USP, localizada no bairro da Lapa, em São Paulo. Quinzenalmente, aos sábado, eles apresentam “A Química das Sensações”, cujo público é majoritariamente escolar. Neste espetáculo, uma das experiências mais memoráveis é a do “chopp espumado”. Misturando detergente amarelo, iodeto e água oxigenada, o voluntário da ocasião se assusta quando o líquido começa, de repente, a espumar. “Em 40 minutos, pedimos participação do público quatro vezes. Nos esforçamos para aproximar a química das pessoas, não pode ser chato”, aponta a estudante de química. Pelo jeito, o reconhecimento é imediato e satisfatório. “As crianças agradecem, dão parabéns e, às vezes, pedem para tirar foto conosco”, conta ela.
O fato de se apresentarem durante a Semana dos Bixos do IQ com certeza atrai muitos calouros. Desde o ano passado, a equipe renovou seu elenco. Para alguns, fazer parte de um grupo de teatro durante a faculdade é uma oportunidade de dar continuidade a algo que já era prazeroso no passado, enquanto que para outros, torna-se uma novidade. Luiza Marques, que estuda teatro desde a sétima série do ensino médio, já mostra sintomas de saudades. “Gosto muito do grupo. Acho que ainda não estou pronta para largá-lo”. Como a integrante “mais veterana”, Luiza tem a voz mais forte na equipe. Voz esta que serve de exemplo. Os novatos Nathalia Kamei Nakano, Mariana Romano e Dimitri Anastopulos se viram atraídos pela proposta. “Decidi fazer química depois de ver uma peça do grupo no evento Portas Abertas, promovido pela USP”, assume Nathalia. Além da diversão e aprendizagem, Anastopulos lembra outra vantagem. “É um jeito de fazer novos amigos”, disse o calouro.
Para que tudo caminhe de maneira organizada e previamente ensaiada, são feitos dois encontros semanais, às terças e quintas. “Em um dia discutimos as questões burocráticas e no outro ensaiamos as peças, treinamos voz e improvisação”, diz Luciene. No final das contas, uma afirmação pode ser feita com precisão. O teatro interdisciplinar do “Química em Ação” mostra que, para sair do cotidiano “exático”, eles têm a fórmula.“É uma aprendizagem em todos os sentidos”, entrega Luciene.