São Paulo (AUN - USP) - A arte não deve se dissociar da política e os artistas devem se reconhecer essencialmente como trabalhadores. Esta ideia, exposta por Luciano Carvalho, do coletivo teatral Dolores Boca Aberta Mecatrônica das Artes, foi central no seminário Cultura e Educação Popular, realizado pelo Centro de Estudo, Pesquisa e Ação em Educação Popular (Cepaep) da Faculdade de Educação. Com o objetivo de aprofundar o debate sobre o assunto e pensar em suas possibilidades de atuação, os palestrantes discutiram a respeito do papel da arte na sociedade capitalista, acreditando em sua necessidade de articulação com outras iniciativas de educação popular para que esse tipo de sociedade seja transformada ou abolida.
Para Luciano, o reconhecimento dos artistas como trabalhadores já é uma primeira forma de libertação do capital. O coletivo Dolores, por exemplo, trabalha em forma de mutirão por este motivo. Segundo ele, isso constrói métodos de criação em que todos os participantes têm consciência de sua colaboração, rompendo com a divisão intelectual e com a hierarquização do trabalho.
Reforçando este pensamento, a professora Iná Camargo Costa, da FFLCH-USP, afirma que a arte não funciona por ordens, da onde quer que elas venham. Deste modo, a ela torna-se inimiga de uma sociedade capitalista, visto que esta priva a liberdade necessária à sua total realização. E é por isso mesmo que a arte não pode fugir ou se isolar de crises e movimentos políticos. Célio Romoaldo, do setor de cultura do MST, ainda acrescenta a este pensamento o fato de que a arte deve reconhecer seu inimigo, tomando por base o conceito da luta de classes. Segundo ele, quando uma classe não identifica seu oponente, ela tem dificuldades de identificar a si mesma, o que para ele pode ser uma explicação para o estado de apaziguamento social identificado por ele no Brasil atual.
Se a divisão entre cultura e política é falsa, ela somente favorece àqueles que temem a arte. Ou seja, o capital. Para tentar reverter esta situação é que o coletivo Dolores Boca Aberta pensa ser necessário plantar um conflito na arte, para que seus trabalhadores se politizem e passem assim a questionar a ordem vigente das coisas. Luciano Carvalho assume que esta não é uma tarefa fácil e que não espera mudar o mundo todo com ela, “até porque vivemos sob uma lógica que nos foi imposta e que ocupa toda a estrutura social, mas é necessário começar a ação de algum ponto”. Por isso, o coletivo liga arte, política e educação popular, já que o próprio participante constitui uma consciência que o forma. Segundo ele, o trabalho alienado prova as pessoas de uma relação orgânica com o mundo. Assim, eles consideram redefinir alguns segmentos das artes, para que ela seja de fato universal e não especializada.
Os palestrantes consideram ser necessário, além disso tudo, cuidar do acervo e do patrimônio cultural já construídos pela classe trabalhadora. Segundo Célio Romoaldo, a burguesia se apropria da produção cultural dos trabalhadores. Em suas palavras a “classe trabalhadora foi saqueada, pois produz cultura e arte que depois são incorporadas pelo capitalismo, e quando há uma tentativa de resgate dessa cultura, ela volta diferente de sua forma original”. Para ele, este é mais um motivo para a arte se afirmar como manifestação anti-capitalista, ideia esta que foi repetidamente defendida pela mesa.
Mais informações sobre o evento ou sobre o grupo de estudos Cepaep podem ser encontrados no email jade@usp.br . O endereço eletrônico do coletivo Dolores Boca Aberta Mecatrônica das Artes é http://doloresbocaaberta.blogspot.com/.