ISSN 2359-5191

06/10/2011 - Ano: 44 - Edição Nº: 95 - Saúde - Faculdade de Ciências Farmacêuticas
Estudo analisa relação entre consumo de gordura saturada e desenvolvimento do câncer de mama
Dieta alimentar durante a gravidez pode aumentar a propensão do feto a desenvolvera doença durante a vida adulta

São Paulo (AUN - USP) - O desenvolvimento de doenças crônicas não-transmissíveis como o câncer pode ter origem no período fetal. Essa é a hipótese estudada por Fábia de Oliveira Andrade, doutoranda da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF). “O estudo busca responder duas questões: o consumo de alimentos ricos em gorduras saturadas por grávidas pode aumentar os riscos de o feto desenvolver câncer de mama na vida adulta? Se sim, como isso ocorre?”, diz Thomas Ong, professor de Nutrição da FCF que está orientando a pesquisa.

O estudo é composto por duas etapas. Na primeira, os pesquisadores separaram ratas prenhas em dois grupos: um foi alimentado com ração rica em gordura e o outro (chamado grupo controle) recebeu ração com níveis adequados de gordura. Após o parto, inclui-se o câncer nos filhotes fêmeas. “Hoje, estamos esperando os tumores se desenvolverem e, então saber se a intervenção alimentar pode ter programado o câncer de mama”, afirma Ong. Ele diz que essa segunda etapa está em andamento e sua conclusão pode demorar por volta de quatro meses. “Após analisar o desenvolvimento dos tumores, vamos sacrificar as ratas e analisar os seus tecidos, buscando explicar os mecanismos que a dieta pode ter alterado, aumentando a suscetibilidade da rata ao câncer”, diz Fábia.

Segundo ela, a idéia do estudo surgiu porque há poucos estudos sobre o desenvolvimento de doenças no período fetal: “Na literatura, há relatos que dizem que algumas doenças como diabetes podem desenvolver-se nesse período, mas o câncer é pouco falado nesse contexto. Como já trabalhávamos com o câncer de mama, pensamos em estudar o seu desenvolvimento na vida intra-uterina”.

Ong conta que essa hipótese de que o câncer de mama poderia ser programado na vida fetal foi proposta pelo epidemiologista Dimitrios Tricopoulos, professor da Universidade de Harvard, na década de 1990. Ele se baseou em estudos que apontavam maior risco de desenvolvimento do câncer de mama em mulheres de maior peso em comparação às de menor. “O peso reflete a exposição do feto ao estrógeno materno durante a gestação. Os estudos focaram a questão do estrógeno e a alimentação é um dos fatores que podem aumentar a circulação desse hormônio na corrente sanguínea”.

O professor explica que essa pesquisa se trata de um estudo epigenético, área que analisa as modificações que ocorrem na molécula do DNA sem alterar a seqüência de bases nitrogenadas (estruturas que, compostas por um açúcar e um grupo fosfato, compõe o DNA). Vários processos epigenéticos ocorrem no desenvolvimento embrionário e a nutrição é um dos fatores ambientais que podem alterá-los. “Alterar um processo epigenético no começo da vida me dá chances de mudar esse padrão e revertê-lo na idade adulta? Como isso impacta na prevenção da doença? Essas são algumas perguntas para a ciência hoje”. Para ele, se a ciência quer encontrar as causas do câncer, é importante olhar o que ocorre no início da vida. “Se descobrirmos o que pode programar a ocorrência de câncer de mama, podemos estabelecer recomendações de prevenção da doença”.

Fábia explica que a escolha do sexo dos filhotes justifica-se pela alta incidência do câncer de mama entre as fêmeas. Segundo dados do Inca (Instituto Nacional de Câncer) de 2008, o câncer de mama é o segundo tipo de câncer mais freqüente no mundo e o mais comum entre as mulheres. Em 2008, ele foi responsável pela morte de 11.860 pessoas no Brasil, sendo 11.735 mulheres. No mesmo ano, esse tipo de câncer matou 45.8503 mulheres no mundo, segundo pesquisa desenvolvida pela Globocan, projeto da Organização Mundial da Saúde (OMS) que fornece estatísticas sobre o câncer no mundo.

Ela ainda conta que, a princípio, eles começaram a avaliar uma dieta hiperlipídica (rica em gordura saturada), pois ela caracteriza a “dieta ocidentalizada”: baixo consumo de fibras, frutas e verduras e alto consumo de gorduras de origem animal. “A vida moderna faz as pessoas se alimentarem cada vez mais fora de casa, o que dificulta a manutenção de uma dieta saudável”, afirma Ong.

Esse cuidado reduzido com a alimentação é ainda mais grave durante a gestação, pois impacta diretamente sobre o desenvolvimento do bêbê. A obstetra Rosa Maria Ruocco, médica assistente da Divisão de Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas de São Paulo, recomenda a suas pacientes uma dieta equilibrada, rica em proteínas e pobre em gorduras, além de alimentos ricos em ômega 3. “O feto precisa incorporar massa muscular, necessita de glicose como combustível para as células e de nutrientes fundamentais para o metabolismo celular, como as vitaminas. Sempre é recomendado consumir legumes e frutas e evitar alimentos industrializados, compostos por substâncias cancerígenas como conservantes e acidulantes”.

Dizer as causas de qualquer tipo de câncer é tarefa muito complexa. Para o professor Thomas Ong, os estudos oncológicos mostram a importância de um olhar interdisciplinar sobre a doença. “A complexidade do câncer, nome que designa por volta de 100 distúrbios relacionados à divisão descontrolada de células, evidencia a necessidade de interligar diferentes áreas do conhecimento, como estatística, epidemiologia e nutrição. De modo geral, a ciência hoje requer cada vez mais a introdução do pensamento multidisciplinar”.

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