São Paulo (AUN - USP) - A crise mundial pode ser uma segunda oportunidade para o Brasil elaborar um novo projeto nacional de desenvolvimento. Segundo o economista Yoshiaki Nakano, a atual crise financeira evidenciou o colapso da teoria dominante dos países hegemônicos e de suas propostas políticas que o Brasil importava. “Vai se abrir um espaço imenso para começarmos a pensar com a nossa cabeça e olhar para nossa realidade. Não vai ter mais modelos de fora pra importar”, afirmou ele em palestra que homenageou o economista e cientista social Luiz Carlos Bresser-Pereira.
Esse espaço ideal para o desenvolvimento, defendido por Nakano é o período entre o declínio da hegemonia norte-americana e a ascensão do “império chinês” , que segundo ele pode durar em torno de duas décadas. “Nesse tempo há a grande oportunidade de ganhar autonomia externa”, diz. Segundo ele, o nacional desenvolvimentismo no Brasil se deu pela primeira vez exatamente no período entre o final do século 19 e meados de 1960 porque havia um contexto histórico específico que permitiu levar a industrialização adiante: o período entre a queda do império inglês e a ascensão da hegemonia dos Estados Unidos. Sem a hegemonia americana, o economista acredita que é possível uma nova versão do nacional desenvolvimentismo, ideia também defendida pelo professor Bresser-Pereira.
Mas considerando o atual contexto político e social do país, Nakano admitiu: “Nós não temos, hoje, uma elite política ou social capaz de formular um projeto nacional de desenvolvimento. Acho que isso é uma característica central do estado e da sociedade brasileira. Existe um vácuo de poder real do lado da sociedade”. Para ele, o Estado brasileiro permanece burocrático e colonial, pois predominam alianças estrangeiras com elites normalmente de regiões pobres. “Concordo que o Estado é importante, mas o que temos considerar o Estado real é o que existe, e que tipo de relação existe entre ele e a sociedade. Ambos ainda não têm agentes sociais suficientemente articulados para botar em prática esse processo de desenvolvimento”, reafirma o economista.
Ele defende que o novo projeto de desenvolvimento do país deve depender muito mais do investimento doméstico do que do aumento das exportações e do desenvolvimento externo. “A nova classe C tem conseqüências políticas se você pensar que eles são 50% da população e que querem emprego, querem crescimento, maiores salários e mais acesso. São a maioria do eleitorado e no sistema democrático representativo de eleição, não tem condições de ser eleito alguém que não cumpra essa demanda. A questão agora é doméstico, é olhar para dentro”, argumenta Nakano.
O economista explicou que o Brasil vive uma condição favorável, refletida no mercado de trabalho: a taxa demográfica caiu, o número da população jovem está diminuindo, os salários começaram a subir, e conseqüentemente, os empresários aumentaram a produtividade. Segundo ele, pela primeira vez tivemos pela primeira vez um mecanismo de auto-dinamismo da economia: “Se eu for julgar essa máquina de crescimento, que nós acidentalmente construímos, pode gerar uma conjunção extremamente favorável para o desenvolvimento brasileiro”, diz.
Para o economista Ricardo Bielschowsky, o Brasil já se evidencia nos estágios iniciais de um novo padrão de desenvolvimento, iniciado no governo Lula e que é mantido no governo Dilma. “Não é difícil identificar. Os planos de governos são gerais, versam sobre questões diversas, mas convergem”, afirma ele. Segundo Ricardo, é possível identificar uma estratégia de condução a três eixos condutores do desenvolvimento: o primeiro motor é o crescimento de distribuição de renda visando o consumo de massa. “Hoje parte da população pobre consume os mesmos produtos que a rica”, argumenta. O segundo eixo são as atividades baseadas em recursos naturais, encabeçadas pela Petrobras, com enorme capacidade de expansão devido a exploração do pré-sal. O terceiro eixo consiste em dedicar recursos a infra-estrutura, de acordo com Ricardo, o Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, evidencia isso. “É um otimismo diante de um mundo que está em uma situação muito ruim”, conclui ele, diante de tais perspectivas de desenvolvimento para o Brasil.
O evento ocorreu na última terça-feira, 6 de novembro, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humana (FFLCH), e integrou um ciclo de palestra sobre vida e obra do professor Bresser-Pereira.