São Paulo (AUN - USP) - A obra a Primeira missa no Brasil, de Victor Meirelles, foi realizada como uma espécie de representação pictórica da Carta de Pero Vaz de Caminha. Por ter sido essa sua origem, o quadro é uma fonte inesgotável de memória e história sobre a época do descobrimento. Foram essas relações entre o que se pode chamar de literatura de viagem e arte de registro que Eliane Pinheiro, aluna do 6º ano de Artes Plásticas, explorou no trabalho Entre a pintura e a narrativa: a Primeira missa no Brasil.
Eliane gostaria de estudar em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) as relações que essa obra estabeleceu com a produção artística nacional no século 17, mas sem deixar de fora a sua reverberação entre o que os artistas posteriores produziram até o século 20. “Estudei outros artistas que em suas obras citaram essa pintura, e textos de críticos importantes da época que me possibilitaram entender como se deu a receptação e interpretação dessa obra entre seus contemporâneos”.
A Primeira missa no Brasilé um quadro narrativo. A obra mostra um altar ao ar livre onde alguns padres jesuítas realizam a missa, cercados por diversos índios seminus e pela mata nativa. Victor Meirelles não presenciou a cena, tampouco a construiu partindo de sua imaginação – ele utilizou os registros históricos de Caminha, descritos nos minimos detalhes, pra retratar o episódio que marcava o início da colonização do país. Dessa maneira, a pintura enfrentou a necessidade de dialogar com a linguagem literária, e escolher alguns elementos formais que permitissem à pintura narrar uma história.
“Na tradição pictórica que procurei estudar, e à qual acredito que Meirelles manteve certo diálogo, esses elementos que permitem a expressão de um discurso foram frequentemente buscados nas poéticas e retóricas clássicas”, comenta Eliane. Ela diz ter procurado investigar a presença desses elementos na Primeira missana tentativa de compreender melhor as relações que essa pintura estabeleceu com a produção nacional e internacional do período.
A escolha dessa obra para desenvolver o estudo está atrelada ao fato de que por ela perpassam muitas questões relevantes para a História da Arte no Brasil. Eliane cita, por exemplo, a consolidação de um ensino artístico oficial no âmbito do Segundo Império (com o incentivo constante do imperador D. Pedro II) e a afirmação de uma cultura nacional, que estende suas reverberações ainda sobre os dias de hoje, quando uma noção hegemônica de identidade é aderida ou questionada – dentre as diversas releituras da Primeira Missa, por exemplo, o Modernismo trouxe, pelas mãos de Portinari, uma versão onde apenas um índio observa o ritual, enquanto diversos jesuítas rezam, ajoelhados.
Para Eliane, o interesse maior desse estudo foi a possibilidade de lidar com um repertório de questões muito amplo, mas que não são abordados, muitas vezes, na graduação em Artes Plásticas. “Com a inexistência de um bacharelado em História, teoria e crítica de arte, a maneira de suprir algumas das lacunas na minha formação teórica foi por meio da iniciação científica e do trabalho de conclusão de curso, que na verdade deve ser considerado muito mais como um ponto de partida para futuras investigações”.