São Paulo (AUN - USP) - Aos 33 anos, quando decidiu voltar a estudar, Roberto da Silva havia passado a maior parte de sua vida confinado em instituições do Estado. Foram 14 anos em diferentes unidades da antiga FEBEM (Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor) e outros sete anos na Casa de Detenção de São Paulo (Carandiru), onde cumpriu pena por crimes diversos.
Ao deixar a prisão, Roberto, que havia largado a escola na 5ª série, fez supletivo e cursou Pedagogia na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). De volta a São Paulo, obteve Mestrado, Doutorado e Livre Docência pela Faculdade de Educação da USP, onde hoje, aos 54 anos, é professor e coordena o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação em Regimes de Privação de Liberdade (GEPÊPrivação).
O GEPÊPrivação surgiu em 2006, quando o Instituto Paulo Freire solicitou que fosse feita uma pesquisa sobre os programas educacionais nos presídios brasileiros para ser apresentada em um congresso da UNESCO sobre educação carcerária. Desde então, o GEPÊPrivação tem auxiliado na elaboração das diretrizes nacionais e estaduais para a educação prisional e trabalhou para a aprovação da lei que permite a remição de pena pelo estudo (Lei 12.433/11).
Educação carcerária
Segundo Roberto, no Brasil, a educação prisional ainda tem como marca a precariedade: “Tudo é feito na base do improviso. Salas de setores administrativos são transformadas em salas de aula. Os períodos não são regulares e faltam professores. É preciso mais organização e sistematização”. No entanto, o professor concorda que as discussões sobre o assunto avançaram bastante, principalmente depois de 2005, quando o Ministério da Educação criou a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secad/MEC), que vem mobilizando parceiros como Ministério da Justiça e o Conselho Nacional de Educação (CNE) para a elaboração de políticas públicas para a educação carcerária.
Em 2006, por iniciativa de um grupo de brasileiros, foi criada, com recursos cedidos pela União Europeia (UE), a da Rede Latino-Americana de Educação em Espaços de Encarceramento (Redlece). A organização une os ministérios da Educação de 11 países e permite a troca de experiências e debates sobre a educação prisional no continente.
Na Argentina, a Universidade de Buenos Aires (UBA) é parceira de instituições carcerárias, onde oferece cursos de graduação aos detentos. Uma iniciativa semelhante está em vias de ser implantada no Brasil. Até junho, a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) inaugurará no presídio do Serrotão, em Campina Grande, seu Campus Avançado, que vai oferecer aos detentos cursos de graduação em Letras, História e Matemática, além do ensino básico e profissionalizante.
Para o professor da Faculdade de Educação, o maior objetivo da educação carcerária deve ser substituir a atual “cultura prisional”, na qual as relações são mediadas pela violência, pela “cultural educacional”, que valoriza a inteligência, a capacidade de argumentação e a curiosidade. No entanto, Roberto afirma que o propósito da educação não é impedir a reincidência ou acabar com a criminalidade e a violência. “O papel da educação dentro das prisões é qualificar o sujeito, ampliar suas habilidades e capacidades para que ele possa competir pelas oportunidades que a sociedade oferece”, explica.