ISSN 2359-5191

01/07/2012 - Ano: 45 - Edição Nº: 57 - Arte e Cultura - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Pesquisa compara representações do diabo na literatura

São Paulo (AUN - USP) - Uma das figuras mais usadas pela literatura é o pacto com o diabo. Presente em diversas obras, ela tem diversas conotações e significados conforme o contexto social e cultural em que é inserida. O próprio demônio é representado de várias maneiras conforme a intenção e o contexto do autor. Esse é o tema da dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada de Maria Cecília Marks. Intitulado Fausto e a representação do diabo na literatura: Um estudo comparativo da tradição fáustica em Guimarães Rosa, Thomas Mann e Fiódor Dostoiévski, o trabalho foi orientado pelo professor Marcus Vinícius Mazzari, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP).

“A análise tem por base a tragédia Fausto, de Johann Wolfgang von Goethe, origem de toda uma tradição que relaciona o demoníaco à insaciabilidade do homem moderno”, afirma María Cecília em sua dissertação, que compara o clássico do escritor alemão com Os Irmãos Karamázov, de Dostoiévski, Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa e Doutor Fausto, de Thomas Mann. “O objetivo geral do estudo é identificar semelhanças e diferenças entre a representação do demônio, as dimensões e consequências do pacto nas obras europeias e na brasileira, tendo em vista a interação dos romances com o processo histórico, a configuração mundial e o amálgama cultural no momento e no lugar em que cada um deles foi escrito.”

“Meu interesse inicial era trabalhar com Grande Sertão: Veredas. Eu tinha intenção de cursar o mestrado e me inscrevi como aluna especial na disciplina ministrada em 2008 pelos professores Marcus Mazzari e Helmut Galle, que trata do pacto fáustico em Grande Sertão: Veredas e em Doutor Fausto.”, conta Maria Cecília. “Durante esse curso, tive oportunidade de ler o Fausto, de Goethe, e trechos do Doutor Fausto e de Os Irmãos Karamázov. Essas leituras foram extremamente reveladoras para mim e me estimularam a aprofundar a pesquisa.”

Não é por acaso que a obra de Goethe é o ponto de partida. “Fausto é um retrato arguto do homem moderno e de seus dilemas: o questionamento, a insatisfação e a insaciabilidade que o tornam refém de um progresso sem fim e sem descanso”, pondera em seu trabalho. “O demônio da modernidade expõe que o ideal de um ser humano absoluto e íntegro é inatingível, pois a condição humana é definitivamente relativa, fragmentada, instável e inconstante.”

A pesquisadora observa que os pactários retratados nas obras tem algo em comum. “Os respectivos demônios exercem o papel de duplos dos protagonistas, que têm como traço comum a condição marginal, de outsiders, posicionando-se criticamente perante as normas vigentes, seja na filosofia para Ivan, na música para Adrian ou na conduta jagunça para Riobaldo.”

No entanto, há diferenças nas construções das imagens do diabo em cada uma das obras. Em Doutor Fausto e em Os Irmãos Karamázov, ele aparece como um ser que tem um corpo. Já em Grande Sertão: Veredas o mesmo não ocorre. “Em Guimarães Rosa, e essa é uma distinção fundamental, o demônio não tem corpo, não aparece, não fala. E tanto se faz mais forte quanto o seu silêncio e a sua ausência são presenças persistentes ao longo da narrativa.”

Maria Cecília também observa que as consequências do pacto são diferentes para cada um dos personagens. “Ivan [Karamázov, protagonista do livro de Dostoiévski] permanece em estado de perturbação e Adrian [personagem de Thomas Mann] passa seus derradeiros anos totalmente inválido, depois de uma vida ascética e solitária.” Já Riobaldo parece não ser tão afetado: deixou a vida de jagunço e agora vive a especular seu passado em suas terras. No entanto, se apega a todo tipo de fé para tentar manter a calma. “A bem de ter crédito no acerto de contas final, também ele reza muito, mas tudo misturado”, diz a estudiosa.

“A análise comparativa elucida e aproxima os textos, que se esclarecem mutuamente por um movimento especular. Também acredito ser válida a sistematização da figuração do demônio e do pacto fáustico nas obras estudadas”, avalia a pesquisadora. Ela ainda diz que planeja continuar com o trabalho sobre essas obras, mas com outro enfoque. “Vou me candidatar ao doutorado e pretendo seguir estudando Grande Sertão: Veredas, com ênfase no aporte teórico de Bakhtin. E também penso em seguir o estudo comparado de Rosa com Thomas Mann em alguns aspectos específicos além do pacto.”

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