São Paulo (AUN - USP) - Em 2001, o universitário norte-americano David Jay fundou a Assexual Visibility and Education Network (AVEN) com o objetivo de agregar pessoas que, como ele, identificavam-se como “assexuais” – nunca haviam sentido desejo sexual por ninguém. Com o passar do tempo, a AVEN, que hoje conta com mais de 30 mil associados, passou ser um espaço de discussão, troca de experiências e construção de conhecimento sobre a assexualidade. O termo “assexual”, inclusive, foi cunhado por Jay.
Doutoranda da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP), Elisabete Baptista de Oliveira dedica-se ao estudo da assexualidade, que ela define como “um novo olhar sobre a sexualidade, no qual a falta de desejo não é vista transtorno, mas como orientação sexual”.
Além de pouco conhecida, a assexualidade ainda é pouco estudada. O primeiro artigo sobre o tema – Assexuality: Prevalence and Associated Factors in a Notional Probability Sample – foi publicado, em 2004, pelo psicólogo canadense Anthony Bogaert. Ao analisar uma pesquisa feita, em 1994, sobre o comportamento sexual de 18 mil britânicos, Bogaert percebeu que aproximadamente 1% deles responderam: “Nunca senti desejo sexual por ninguém”. No entanto, segundo Elisabete, ainda não há dados confiáveis sobre número de assexuais na população, pois os há poucos pesquisas científicas sobre o tema.
Entre as reivindicações da comunidade assexual – principalmente a norte-americana – estão o reconhecimento da assexualidade como uma orientação sexual tão legítima quanto a hétero ou a homossexualidade e a não patologização de sua condição. O desejo sexual hipoativo (falta de vontade de fazer sexo), por exemplo, é listado no Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders como distúrbio sexual.
Amor e sexo
O fato de os assexuais sentirem até mesmo certa repulsa ao sexo não impede que eles se interessem romanticamente por outra pessoa. A não ser no caso dos chamados assexuais arromânticos, que não apresentam desejo sexual nem demonstram interesse em relacionamentos amorosos. O interesse romântico ou amoroso de um assexual pode estar direcionado para alguém do sexo oposto (assexual heterorromântico), do mesmo sexo (assexual homorromântico), como também pode independer do sexo do parceiro, como no caso dos assexuais birromânticos.
Elisabete explica que, entre os polos da sexualidade e da assexualidade, há uma “zona cinza”. Os assexuais que se encontram nesta “zona cinza”, apesar de, via de regra, não sentirem desejo sexual, podem concordar em fazer sexo se estiverem um relacionamento amoroso estável.
Vida de ameba
A maneira como Elisabete escolheu a assexualidade como assunto de seu doutorado é um pouco inusitada. Depois de concluir seu mestrado, sobre gravidez na adolescência, decidiu continuar a pesquisar temas ligados a sexualidade. Ao digitar “sexual minorities” no Google, deparou-se com um vídeo de uma pessoa que se identificava como assexual. Como não havia pesquisas sobre assexualidade no Brasil, sentiu-se tentada a estudar o assunto em seu doutorado.
A tese de Elisabete já tem nome: ‘Minha vida de ameba’: experiências de jovens assexuados na sociedade do desejo sexual compulsório. Inicialmente, as pesquisas seriam focadas nas comunidades de assexuais espalhadas pela internet, mas vários jovens assexuais entraram em contato com a pesquisadora através do blog que ela mantém – assexualidades.blogspot.com – e se colocaram a disposição para colaborar com o trabalho. Muitos deles serão entrevistados por Elisabete sobre sua trajetória rumo autoidentificação como assexuais.