São Paulo (AUN - USP) - Com o objetivo de entender os motivos por quais uma pessoa com pouca ou nenhuma experiência como espectador de teatro deseja ser ator profissional e encontrar uma metodologia que pudesse contribuir para a formação ampla desses atores, a estudante Aline de Oliveira Ferraz defendeu em outubro deste ano a tese de mestrado A formação de atores em escolas profissionalizantes: um estudo sobre o ver e o ser visto, na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.
Aline escolheu o tema por trabalhar em uma escola profissionalizante, onde notou que as razões da escolha pela profissão não eram necessariamente vinculadas ao gosto pela arte teatral. A curiosidade acerca desse assunto fez com que ela repetisse a mesma questão durante anos a cada turma de ingressantes na disciplina de Interpretação Teatral que ministra na Oficina de Atores Nilton Travesso: “Por que ver e fazer teatro nos dias de hoje?”
Ela percebeu que, com certa frequência, os alunos nunca haviam frequentado teatro anteriormente, mas mostravam-se entusiasmados com a possibilidade de serem atores profissionais. Segundo ela, uma das principais razões para isso seria o imaginário equivocado criado pelo cinema e pela televisão. "A veiculação do trabalho desses profissionais em programas televisivos parece promover a ideia de uma existência de privilégios, tais como uma vida de “liberdades” e de destaque. Assim, é possível verificar na sociedade brasileira certo apreço pelas pessoas que se dedicam a essa carreira", afirma.
Ao entender essa distância dos estudantes com o fenômeno do teatro, a pesquisa realizada na Oficina de Atores Nilton Travesso pretendeu lançar um olhar para as atividades vinculadas à apreciação teatral, investigando as possíveis contribuições que a experiência como espectador pode trazer para a formação desses estudantes de artes cênicas. “Eu quis buscar uma metodologia que pudesse equacionar o abismo entre quem vê e quem faz teatro.”
O que Aline concluiu é que a passagem dos atores por escolas profissionalizantes não deve se restringir apenas à aquisição de conhecimento técnicos, mas sim permitir a produção de experiências. Para ela, a ida ao teatro e a apreciação de outras produções teatrais pode fazer a diferença na formação do ator, mas, além disso, é necessária uma apreciação mediada, que possibilite que o espectador aluno se seja um co-autor da encenação, num processo que remeta suas próprias experiências de construir cenas dentro da sala de aula.
A pesquisa revelou uma significativa contribuição da pedagogia do espectador, proposta por Flávio Desgranges, na formação dos estudantes e na ampliação das referências das formas de pensar e reconhecer o mundo. “É no diálogo com outras cenas que se observa e se analisa a diversidade do fenômeno teatral como um patrimônio cultural. É na apreciação de outras produções teatrais e no contato com outras linguagens artísticas que a abordagem da dimensão da pesquisa cênica se efetiva, abrindo espaços para se compreender as relações entre modos de produção e concepções estéticas.”