ISSN 2359-5191

21/10/2004 - Ano: 37 - Edição Nº: 15 - Saúde - Instituto de Química
Dependência de drogas discutida na Semana da Química

São Paulo (AUN - USP) - Desde o século XVII a medicina já conhece os fenômenos da tolerância e da síndrome de abstinência em dependentes químicos. Sabe-se que após certo período de uso de drogas efeito prazeroso desaparece, pois o organismo do usuário perde a sensibilidade a seus princípios ativos. Também são conhecidos os sintomas físicos e psicológicos que freqüentemente advêm do abandono dessas substâncias às quais o corpo já se adaptou, que podem levar até mesmo à morte. A professora Mônica Zilberman, que trabalha com dependência química no Hospital das Clínicas, falou sobre esses processos em sua palestra “Neurobiologia da Dependência às Drogas”, ministrada como parte da 21a Semana da Química.

A exposição abordou o problema central que o tratamento da dependência química enfrenta atualmente: as alterações na fisiologia dos neurônios (plasticidade neural) causadas pelas drogas. São essas alterações que explicam a dificuldade de recuperação de um dependente, mesmo que ele já não sinta mais efeitos prazerosos da substância, e que os sintomas de abstinência possam ser tratados. As drogas ativariam a produção de certas proteínas, que adensariam a rede de neurônios do dependente e criariam “memórias-gatilho”, ou seja, associariam, no inconsciente, as circunstâncias ligadas ao uso da droga ao desejo por ela. Assim, situações, pessoas ou lugares associados à substância poderiam causar recaídas. Este mecanismo é muito dificilmente revertido, e o tratamento psicoterápico visa torná-lo consciente, para que os “gatilhos” possam ser evitados.

O professor Ronald Dennis Ranvaud, de Ciências Biomédicas (ICB-USP), em sua palestra “Dependência Química e Percepção de Tempo”, expôs um modelo alternativo para explicar a dependência de drogas, proposto por Gene Heyman, da Universidade de Harvard, que não considera a dependência como uma patologia, mas como uma situação onde a possibilidade de escolha permanece. O mecanismo de dependência se associaria à percepção do tempo na tomada de decisões: a longo prazo, as vantagens do uso de drogas diminuem constantemente à medida em que se instala a tolerância e que o dependente passa a ter perdas em outras esferas de sua vida – familiar, amorosa e profissional, por exemplo - por conta do vício. Mas também diminuem as vantagens de não usar drogas, uma vez que surgem os efeitos da abstinência (ou a permanente ameaça deles) e que o dependente, vivendo cada vez mais em função da droga, passa a ter menos a perder. Segundo este modelo, as chances de cada indivíduo de se tornar dependente químico variam conforme sua propensão a cair nesta “armadilha” da percepção temporal. Tal vulnerabilidade pode ser avaliada por um jogo de computador que analisa os parâmetros de tomada de decisões apresentando situações que, assim como as drogas, apresentam vantagens a curto prazo e desvantagens a longo prazo.

O modelo se apóia em casos documentados de recuperação de dependentes que não seriam explicados pelo modelo tradicional da patologia ou do condicionamento, atualmente aceito pela Organização Mundial de Saúde. Questiona ainda o estudo que originou o modelo tradicional, realizado nos anos 60 nos Estados Unidos, com pacientes de clínicas de recuperação. Para Ranvaud, a amostra desse estudo não pode ser considerada representativa da população geral. Foram selecionados apenas sujeitos que apesar dos bloqueios sociais existentes haviam tomado a decisão de usar drogas, e não haviam conseguido deixar de usá-las por conta própria, compondo, assim, uma amostra viciada (sem trocadilho).

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