ISSN 2359-5191

23/05/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 23 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
“Emprego doméstico não sobrevive sem humilhação”, afirma sociólogo

A humilhação da trabalhadora doméstica por seu patrão - principalmente por sua patroa - é um fator intrínseco na maneira em que esse relacionamento se dá no Brasil. Desigualdades raciais, de gênero e sócio-econômicas são cotidianamente afloradas com o objetivo de rebaixar a empregada e, assim, aumentar a distância entre ela e a empregadora.

Foi o que demonstrou o sociólogo Jefferson Belarmino. Em sua pesquisa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Belarmino entrevistou dez empregadas domésticas e também duas patroas para tentar compreender essa convicência e como se dá esse relacionamento. Livros de etiqueta, material jornalístico e documentos sobre o assunto também foram objetos da análise do pesquisador.

Apesar de o emprego doméstico proporcionar alguma proximidade espacial, a patroa faz de tudo para manter um relacionamento distante e opressor para com a empregada. “Nesse relacionamento, temos duas classes sociais diferentes que dividem um mesmo espaço privado, porém a distância social entre elas é muito grande.” As empregadas se sentem rebaixadas moralmente por haver, na mentalidade coletiva do povo brasileiro, sobretudo das camadas mais pobres, uma atitude de subserviência em relação aos poderosos. Acusações de roubos são bastante comuns, devido à visão preconceituosa do empregador  em relação aos estigmas sociais a que geralmente essa trabalhadora faz parte.

Nessa relação, há ainda resquícios do sistema escravista que assolou o Brasil por quase quatro séculos. “Um emprego em que a mulher é obrigada a viver na casa do patrão, no quartinho designado a ela,  tendo de estar 24 horas a serviço da família, é uma realidade bastante comum no nosso país e reflete um regime de quase escravidão ainda vigente”, afirmou Belarmino.

A empregadora também priva a trabalhadora de sua feminilidade. “A patroa quer se autoafirmar como ‘fêmea-alfa’ da casa”, afirma Belarmino. Isso faz com que haja a preferência por trabalhadoras de mais idade e menos atraentes. “A relação de ciúme entre patroa e uma empregada jovem é bastante comum”. O pesquisador relatou também o uso obrigatório do uniforme como método de humilhação e supressão da vaidade feminina das empregadas.

Às vezes, há, por parte da patroa, um falso discurso de ‘igualdade’, de que a trabalhadora doméstica ‘é quase da família’. “Ela é ‘quase da família’, mas não permitem que ela se sente para almoçar com os patrões”, analisa o pesquisador. Além do mais, a relação é tida como passional ou profissional quando convém aos patrões. “Muitos manuais de etiqueta tendem a aconselhar as patroas a exigirem um comportamento profissional de suas empregadas.” No entanto, quando esse profissionalismo é revertido em direitos, como, por exemplo, com a PEC das Domésticas, os empregadores se defendem, dizendo se tratar de uma relação passional.

Preconceito e vergonha são sofridos frequentemente por essa empregada. “Muitas dessas mulheres querem mudar de emprego. Algumas não admitem publicamente seu encargo”, afirmou o sociólogo. Por esta razão, a principal colaboração de seu estudo foi a sistematização das muitas desigualdades do emprego doméstico e mostrar como ele engloba vários tipos de preconceito. “O emprego doméstico reforça e só funciona com base nas desigualdades”, concluiu.

Crédito da Imagem: Cena do documentário Doméstica, de Gabriel Mascaro

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