Os Centros de Estudo de Línguas (CEL) foram implantados pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo para que estudantes a partir do sétimo ano do Ensino Fundamental até o último do Médio da rede pública pudessem ter acesso gratuito a aulas de línguas estrangeiras. Atualmente existem 266 centros em funcionamento em todo o estado, onde professores diplomados ensinam espanhol, inglês, italiano, francês, alemão e japonês.
Entretanto, ainda há uma série de problemas envolvendo esse programa governamental. Um deles é o fato de muitas turmas serem multisseriadas, ou seja, há alunos com níveis diferentes de conhecimento do idioma estudando juntos. Em sua tese de mestrado "Juntar ou separar? Reflexões sobre o contexto multisserial de ensino de Francês como Língua Estrangeira (FLE) nos Centros de Estudos de Línguas (CEL)", a pesquisadora Lilian Paula Martins Godoy, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP), mergulhou à fundo nessa questão, focando no ensino de francês nesses centros.
Surgimento de turmas multisseriadas
Através de um processo que envolveu pesquisa bibliográfica dos documentos oficiais dos CEL, pesquisas etnográficas e qualitativas, conversas com professores e da observação de algumas aulas, a pesquisadora pôde começar a entender porque essas turmas acabam sendo formadas e quais as consequências disso no aproveitamento dos alunos e professores.
Lilian afirma que a legislação que regulamenta o funcionamento dos CEL é a origem do ensino multisserial. “De acordo com ela, poderá ser autorizado o funcionamento de turmas com no mínimo 15 alunos, garantindo a conclusão para os matriculados. No entanto, nem sempre é possível garantir esse mínimo”. As salas se iniciam com uma média de 30 alunos. Porém, há uma enorme taxa de desistência no decorrer do curso, e para que o número mínimo de estudantes seja respeitado, turmas que misturam níveis diferentes de conhecimento são formadas. “Ressaltamos que isso já é bastante recorrente e faz parte do cotidiano dos CEL”, completa. Atualmente, mais de 20% dos CEL apresentam turmas multisseriadas há dez ou mais anos.
Entraves ao ensino
A pesquisadora entrou em contato, especificamente, com as turmas de francês. Principalmente por conta das conversas com os professores e da observação de algumas aulas, ela chegou a conclusão de que o maior problema desse tipo de ensino é a falta de orientação metodológica. Os docentes não são treinados para ensinarem turmas multisseriadas, já que elas não são oficialmente reconhecidas pela regulamentação dos centros.
Os professores se tornam inteiramente responsáveis pela forma que dão suas aulas e buscam diversificar suas estratégias de ensino ao máximo para garantir o aprendizado de todos os alunos. De acordo com Lilian, 87,5% dos docentes dizem trabalhar com o grupo como um todo, passando sempre os mesmos conteúdos ao mesmo tempo a todos. Os outros 12,5% afirmaram que separam a turma em função dos níveis apresentados e passam atividades diferentes de acordo com essa divisão.
Não se pode dizer qual das duas formas é a mais efetiva já que, na prática, os professores não ministram suas aulas de acordo com a estratégia que afirmaram seguir nas conversas com a pesquisadora. De qualquer forma, não importando as medidas tomadas, nem aluno nem professor alcançam a eficácia que atingiriam se as turmas não fossem mistas.
Como possível solução, a pesquisadora acredita que a adequação metodológica ao contexto atual possibilitaria o desenvolvimento de atividades, uma maior interação com o grupo e um ambiente de sala de aula colaborativo. Também incentivaria o docente a pensar em diferentes estratégias de ensino adequada à turma, mesmo que multisseriada.