São Paulo (AUN - USP) - A retomada do cinema nacional, nos anos 90, chegou a ser comparada pela grande imprensa com o antigo Cinema novo, da década de 60. Um dos motivos seria o deslocamento das produções cinematográficas para um campo de discussão política. Porém, apesar dos muitos projetos realizados, os filmes nacionais não conseguiram trazer para a sociedade a discussão de tal temática. Roberto Tadeu Noritomi, em sua pesquisa de doutorado em Sociologia, Cinema e política: resignação e conformismo no cinema brasileiro dos anos 90, realizada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP), explica as causas da falha desse projeto político.
Segundo Noritomi, o cinema de retomada se montou sobre um eixo crítico. Temas como exclusão social, relações corruptas institucionais e problemas da intimidade, foram bastante abordados, quase sempre, criticando uma estrutura que se tentasse definir como nacional. Porém, as relativas uniformidade e superficialidade no pensamento dos cineastas responsáveis por essa retomada não conseguiram tratar os temas políticos de forma efetiva.
Para exemplificar, Noritomi analisa filmes como Cidade de Deus e O Príncipe, de Fernando Meirelles e Ugo Giorgetti, respectivamente, onde, apesar de serem mostradas cenas de extrema violência e pobreza, os motivos que geraram aquilo não são abordados. Isto é, o pensamento dicotômico gerou no cinema apenas “retratos da realidade, não as causas da realidade retratada”.
Monopólio da pequena produção nacional
A retomada já se encerrou. E, segundo Noritomi, “o ‘período de euforia’ se foi e agora nós temos uma rotina de produção cinematográfica”. Porém, o cinema nacional, com média entre 20 a 30 produções anuais, ainda é extremamente frágil, pois está concentrado em praticamente apenas dois grupos, Globo Filmes e Columbia. Este monopólio, apesar de estar começando a ser “democratizado” pela presença de produtoras como Conspiração e O2, é uma das causas da visão simplista da sociedade brasileira e que não consegue (ou não quer) abordar os mesmos assuntos de modo mais crítico e mais profundo.
Visão de elite
Outra causa é o fato de a grande maioria dos poucos cineastas brasileiros ser proveniente da elite econômica nacional, assim, o cinema acaba sendo realizado quase que exclusivamente pelas classes mais elevadas, dando uma visão da elite sobre a sociedade. Além disso, lembra Noritomi, como a formação acadêmica desses cineastas é baseada no cinema internacional, sobretudo de Hollywood, “não há como fugir, e os cineastas acabam sendo influenciados inconscientemente”. Decorre daí a incompatibilidade entre as necessidades políticas da nossa sociedade e a tentativa de participação política no chamado cinema de retomada da década de 90.
Mais informações: noritomi@usp.br