“Um dia o chocolate faz bem, outro dia faz mal. Um dia a cerveja pode nos matar, no outro é dito que podemos tomar uma cerveja por dia sem problemas. Isso é um paradoxo”, afirma Tatiana Aoki, jornalista e mestre em comunicação pela Escola de Comunicações e Artes (ECA), da USP. Foi em função desse comportamento das mídias em relação aos alimentos que Tatiana estabeleceu 32 diretrizes para serem utilizadas por profissionais da comunicação quando tratarem do tema.
Para sua análise, Tatiana partiu de um conceito chamado “nutricionismo”, que foi popularizado pelo jornalista norte-ameriano e professor da Universidade da Califórnia em Berkeley, Michael Pollan. Considerado a ideologia oficial da dieta ocidental, o nutricionismo se baseia na avaliação científica de um alimento apenas por um componente das propriedades nutricionais, sem considerar o conjunto de nutrientes presentes. Ou seja, “um alimento é apenas seu nutriente. Nessa situação, é mais fácil de se manipular os valores de uma nutrição”, explica Tatiana.
Por exemplo, “se falarmos que o leite é só o cálcio, que o que importa nele é só o cálcio e que isso é que está na moda. Nós podemos então criar um alimento qualquer, alegar que ele está lotado de cálcio e que, por isso, ele seria melhor que o leite”, afirma a pesquisadora. Desse modo quando um único nutriente é utilizado para qualificar um alimento como “bom” ou “ruim”, qualquer alimento pode ser classificado ou como “bom” ou como “ruim”. Por isso, “a cada hora surge um novo nutriente considerado moda”, diz Tatiana.
Além de movimentar a indústria alimentícia, essa prática também incentiva a indústria farmacêutica. Afinal, “uma área está intimamente ligada à outra. Um exemplo disso é o caso do salmão. Por causa do ômega 3, presente no peixe, houve um aumento no seu consumo. Em seguida, a indústria farmacêutica produziu vários produtos artificiais, a partir da alegação de que eles tinham ômega 3. O que gera um grande paradoxo em relação ao alimento. Porque, na verdade, o salmão é saudável pela combinação de nutrientes que há nele, não apenas pelo ômega 3”.
Sobre esses novos alimentos produzidos pela indústria farmacêutica, Tatiana inclusive fala que “eles não são tão novos assim. São sempre os mesmos. Há uma rotação entre alimentos a base de soja, de açúcar e de gordura”.
Como falar de comida
De acordo com a pesquisa, o jornalismo ajudou muito a difundir essa ideia de que só o nutriente do alimento faz ele ser considerado bom ou ruim – a tal ponto de a pesquisadora afirmar não ter encontrado nenhum veículo que utilizasse outro tipo de discurso.
Além disso, Tatiana também diz que “às vezes, é melhor acreditarmos nas tradições das nossas avós, do que ouvirmos o que falam na imprensa. O Polland mesmo afirma isso. Mas não significa que temos que subestimar a ciência, é só para não acreditarmos nela como se fosse uma religião. Temos que desconfiar. Caso contrário, um dia vamos comer chocolate, e no dia seguinte não mais”.
Frente a isso, Tatiana organizou um total de 32 diretrizes que indicam a maneira como o jornalista deveria tratar as pautas de alimentação. Entre elas estão: “Ao falar de algum alimento novo, em vez de fazer somente a divulgação, ensine o público a ler o rótulo”. Afinal, apenas com a devida explicação sobre os termos científicos presente nos rótulos é que o público poderá saber, de fato, o que é que está comendo e as consequências da ingestão dessa comida.
Outra diretriz, como indica a pesquisadora, é a de que uma divulgação inadequada e muito generalista, como “coma chocolate e emagreça”, pode adoecer um diabético com problemas de peso. Ou seja, nem toda dica nutricional pode ser indicada para qualquer um.
As 32 diretrizes podem ser conferidas neste link.