São Paulo (AUN - USP) - A utilização de dispersantes para dissolver a mancha de óleo causada pelo afundamento da plataforma P-36 da Petrobrás, na bacia de Campos (RJ), no dia 20 de março deste ano, não foi necessariamente a pior solução para o problema ambiental causado, mas com certeza vai deixar seqüelas. Pelo menos é essa a avaliação da Professora Sônia Maria Flores Gianesella, pesquisadora de Ecologia do Fitoplâncton e Produtividade Primária no Deparatamento de Oceanografia Biológica do Instituto Oceanográfico da USP (IO-USP).
No acidente, em que morreram 11 pessoas, vazaram no mar entre 350 mil e 1,5 milhão de litros de petróleo (os números divulgados variaram bastante). O petróleo, explica Gianesella, apresenta mais de um efeito deletério quando derramado no mar. Primeiro: por ser um óleo, a maior parte dele não se mistura com água e se concentra na superfície, dificultando ou obstruindo a entrada de luz nos primeiros 100 metros de profundidade. É nessa região que se concentra o fitoplâncton, produtor primário e base de toda a cadeia trófica marinha. Se o fitoplâncton não recebe luz, fica incapaz de fazer fotossíntese, não produz energia e conseqüentemente o ecossistema todo é afetado. Segundo: o petróleo tem também uma fração solúvel que, justamente por isso, não fica só na superfície. "E essa fração é altamente tóxica", diz ela.
Os dispersantes utilizados pela Petrobrás tiveram o objetivo de "quebrar" quimicamente a mancha em partes tão pequenas que pudessem ser absorvidas pelo mar. Mas, adverte Gianesella, "dependendo do dispersante, a mancha de óleo desce para toda a coluna de água e pode até afetar organismos que vivem em alta profundidade, como os bentônicos, por exemplo". Ela acredita que a opção, no caso, teria sido o acompanhamento da mancha por navios, até que ela fosse naturalmente absorvida pelo meio ambiente. Mas essa solução, segundo a pesquisadora, apresentaria maiores riscos tanto ao ecossistema como à Petrobrás. A proximidade da mancha de óleo junto a outras plataformas de extração ou armazenamento poderia ser causar um desastre ainda maior se, por algum acidente, o óleo se incendiasse, por exemplo. Mas, insiste ela, mesmo assim, "a solução adotada (o uso de dispersantes) não é de modo algum inócua".
Gianesella diz ainda que foi preciso evitar que a mancha viesse para o litoral, caso em que, segundo ela, o uso de dispersantes estaria fora de questão, pois o desastre seria ainda maior: "Na região costeira, a diversidade biológica e a concentração de indivíduos são muito maiores que em alto-mar, e o dano que o petróleo dispersado causaria nesse caso seria incalculável", argumenta. Além do que, a proximidade da mancha junto à costa tornaria o acidente ainda mais visível para a população. Ao contrário do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Petrobrás negou que a mancha pudesse atingir o litoral, como de fato não atingiu.
Ela defende a gradual extinção do uso de combustíveis tóxicos à base de petróleo, e sua conseqüente substituição por fontes alternativas e não-poluentes de energia, como o álcool, por exemplo. O problema, diz, é que "quando se calcula o preço do petróleo, não se leva em conta todo o prejuízo ambiental e mesmo financeiro que um desastre desse porte pode causar". Para ela, quando se trata de fontes de energia poluentes, o que parece barato acaba saindo caro, cedo ou tarde. E é uma tese coerente: pouco menos de um mês depois do acidente da P-36, no dia 11 de abril, vazaram mais 13 mil litros de óleo da plataforma P-7, na mesma Bacia de Campos. Já é o terceiro acidente envolvendo a Petrobrás neste ano.