Uma análise realizada com 31 espécies animais, todas coletadas na Baía do Almirantado, Antártica, exibiu concentrações de metais consideradas naturais para o ecossistema da região. A dissertação de mestrado da aluna Tailisi Hoppe Trevizani, financiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), e sob orientação do Prof. Dr. Rubens Cesar Lopes Figueira, indica que, até o ano de coleta do material, não havia grandes contaminações advindas da ação antrópica na baía.
Mapa dos pontos onde foram coletadas as amostras biológicas / Créditos: Fabiany Trevizani Gasparello
O material biológico foi colhido em quatro pontos diferentes da Ilha Rei George, sendo um deles a região em que se localiza a estação brasileira de pesquisas Comandante Ferraz. As amostras incluíam macroalgas, bentônicos (animais que vivem no substrato, no fundo do mar) e suspensívoros (animais filtradores que vivem na coluna d’água, próximos aos sedimentos). Através do convênio entre Proantar (Programa Antártico Brasileiro) e IO-USP, o material chegou ao instituto e ficou à disposição para pesquisas. As de Tailisi se iniciaram em 2012.
As amostras consistiam nos animais previamente limpos, secos, e pulverizados. Por meio de um ataque ácido, elas foram transformadas em soluções homogêneas a fim de serem analisadas em um aparelho que fornece as concentrações de metais em substâncias líquidas a partir da radiação que cada um deles emite, o ICP-OES.
Depois de analisados, os resultados indicaram grande disponibilidade de cobre e zinco no ambiente, tanto nos sedimentos quanto nos organismos. Além disso, indicaram uma tendência de biomagnificação de cobre na cadeia alimentar (ou seja, aumento da concentração do metal com o aumento do nível trófico dos animais), bem como bioacumulação de arsênio nos níveis de base da cadeia (macroalgas) e de cádmio, em menor quantidade. Esses dados, porém, correspondem às condições naturais do ambiente analisado.
“[Os resultados] Não vieram das atividades antrópicas na região. Isso quer dizer que, até 2003, as atividades humanas não causavam grande contaminação ao ambiente. Por isso esses resultados servem como referência. Em pesquisas futuras, talvez possamos notar um aumento desses contaminantes”, explicou Tailisi.
Para a oceanógrafa, utilizar a pesquisa como base para outros estudos é fundamental, já que as amostram datam de mais de dez anos atrás. A importância teria se intensificado depois do incêndio que destruiu a Estação Comandante Ferraz, em fevereiro de 2012.
“A estação era na região costeira, muito próxima da água do mar. Com o incêndio, existe a possibilidade de alguns metais terem sido carreados pelo solo, levados aos sedimentos marinhos e com isso entrado na teia trófica” esclareceu a pesquisadora.
Como os animais analisados pela pesquisa vivem em meio ou muito próximos aos sedimentos, eles podem ingerir esses metais junto ao alimento. Segundo Tailisi, se os metais estiverem diluídos na água, eles também podem ser assimilados pelos organismos. “É uma hipótese”, concluiu.
Proantar e biomonitor
Segundo o site do Ministério do Meio Ambiente, o Programa Antártico Brasileiro tem uma proposta de ampliar os conhecimentos a respeito da Baía do Almirantado, a fim de estabelecer um programa de monitoramento ambiental para a região. A pesquisa de Tailisi faz parte desse projeto.
Por isso, um dos objetivos do estudo era encontrar uma espécie que funcionasse como biomonitor, ou seja, um animal que pudesse representar as condições gerais do local em que habita. O molusco bivalve Laternula elliptica correspondeu às expecativas, e pelo fato de existir em abundância na região de análise, não migrar, ser de fácil identificação e coleta, suportar as variações de salinidade das águas e ter capacidade de acumular os contaminantes, foi considerado um bom biomonitor.