Uma pesquisa realizada com microalgas encontrou dois tipos diferentes de corantes capazes de detectar atividade ou inatividade celular em microorganismos vegetais marinhos. Desenvolvido pela aluna de mestrado Izadora de La Volpe Mattiello, o estudo tem por objetivo oferecer um modo mais rápido e prático de identificar seres vivos unicelulares que, quando despejados em portos estrangeiros ao do seu habitat, podem se reproduzir e afetar o equilíbrio natural das espécies do ambiente.
Em consonância com a Convenção Internacional de Controle e Gestão de Água de Lastro e Sedimentos de Navios, a pesquisa faz parte de um projeto que visa diminuir e monitorar o impacto da água de lastro (água do mar que é colocada nos tanques dos navios para dar sustentação) nos ecossistemas dos portos marítimos. A Convenção, que foi elaborada pela Organização Marítima Internacial (IMO) e que está para entrar em vigor, busca estabelecer um protocolo internacional de tratamento e verificação dessa água antes que ela seja despejada no mar.
O estudo de Izadora foi desenvolvido a fim de se testar corantes que pudessem identificar microalgas vivas ou mortas em amostras pequenas dessa água de lastro. As cinco espécies* cobaias foram cultivadas em laboratório e escolhidas de acordo com várias características, como resistência ou sensibilidade a mudanças de ambiente e procedência. O objetivo seria ter o maior número de diferenças possível entre as espécies para que a pesquisa pudesse ser generalizada.
“Os indivíduos que fizerem parte das famílias dessas espécies devem ter um comportamento parecido diante de cada tipo de corante”, explicou Izadora. Também por essa razão, o estudo, feito com amostras isoladas de cada uma das espécies, poderia ser transferido para a água de lastro, abrangendo diversos gêneros e famílias de microalgas.
Depois de cultivadas, as amostras foram tratadas com cinco corantes. Três deles, chamados vitais, identificavam os microorganismos vivos. Os outros dois, denominados mortais, identificavam aqueles que estavam mortos. Como o objetivo era testar a eficácia de cada substância, a pesquisadora já tinha ciência da proporção de células vivas e mortas em cada amostra de organismos. Se, por exemplo, a porcentagem de células vivas fosse de 75%, um corante vital deveria corar 75% das células, e um corante mortal, 25%. Diferentes proporções foram utilizadas, e a contagem foi realizada no próprio microscópio ou em imagens dele capturadas.
Ao fim das análises, dois corantes se mostraram eficazes para quatro das cinco espécies testadas: o vital vermelho neutro e o mortal azul de Evans. Uma vez comprovado que funcionam, eles poderiam ser aplicados em amostras com porcentagens de células vivas e mortas desconhecidas, a fim de que se descobrir esses valores.
Reação da espécie Alexandrium tamiyavanichii a corantes vermelho neutro (acima) e azul de Evans (abaixo). De acordo com as porcentagens, na sequência superior de imagens, as primeiras quatro células foram consideradas coradas, e portanto, vivas. Na sequência inferior, somente até a 3ª imagem as células foram consideradas coradas, logo, mortas / Créditos: Izadora Mattiello
Então, se o método fosse utilizado em porções da água de lastro de determinado navio, por exemplo, os valores encontrados seriam transferidos para uma quantidade maior do líquido. Com isso, seria possível obter o número aproximado de microalgas vivas que poderiam se reproduzir e invadir o ecossistema do local em que a água fosse depositada, assim como fiscalizar se a água que chega em cada navio necessita ou não de tratamento antes de ser descartada.
Segundo a pesquisadora, ambos os corantes são vantajosos pois, além de serem eficazes, são baratos e fáceis de manusear: basta comprar o pó e diluir em água destilada. Por não serem fluorescentes, podem ser analisados em qualquer tipo de microscópio, sem necessitar do auxílio de ferramentas mais sofisticadas.
A maior vantagem, porém, reside no fato de eles serem rápidos na identificação, diferindo do método de crescimento celular utilizado por alguns países desenvolvidos, que demora semanas para obter resultados. “Quando um navio chega no porto, não pode ficar lá por muito tempo, porque paga um aluguel. O corante dá a resposta em 20 minutos, e se utilizar um equipamento automático na análise, é mais rápido ainda”, concluiu Izadora.
A desvantagem envolvida no processo é que, em caso de incorporação do método, os profissionais contratados pelos portos teriam de receber um treinamento prévio, aumentando os custos. Segundo a pesquisadora, a necessidade adviria do fato de que a pessoa incubida da análise da água de lastro precisaria aprender um padrão de coloração (até que nuance de cor a célula pode ser considerada corada) antes de avaliar a situação do material biológico presente na amostra.
Ressalvas
Apesar da eficácia do método, Izadora ressaltou que ele não é definitivo, já que houve espécies resistentes aos dois corantes. “Eles são bons, mas ainda não dá para ser universal. O protocolo [da IMO] teria que ter mais algum corante, ou algum outro método”, explicou a pesquisadora.
Ela também destacou que outras pesquisas semelhantes estão sendo realizadas no mundo inteiro, não só para se testar outros corantes ou métodos, como para ter experiências com espécies nativas de outros lugares do oceano. Isso contribuiria para gerar um protocolo internacional eficiente, pois as semelhanças de resultados entre as pesquisas poderiam auxiliar na escolha dos melhores métodos gerais para identificação de material biológico na água de lastro.
Izadora lembrou que os tanques dos navios são grandes e que, por essa razão, diferentes porções de água devem ser analisadas para se ter um controle mais eficaz. Além disso, outros seres marinhos, como zooplâncton e peixes, podem vir na água de lastro e devem ser analisados através de outros procedimentos.
Por fim, em outro capítulo da dissertação, a pesquisadora estudou o uso de corantes após as amostras receberem recursos de tratamento da água de lastro. Ela salientou que, dependendo do método utilizado, os corantes não funcionarão como método de validação dos tratamentos.