São Paulo (AUN - USP) - Há tempos, um cientista brasileiro descobriu a ação anti-hipertensiva de uma certa molécula presente no veneno da jararaca. As descobertas deste cientista “vazaram” na época dos seus trabalhos. O medicamento Captopril, mundialmente empregado no combate à hipertensão, só pôde ser desenvolvido graças à pesquisa deste brasileiro. Resultado: os brasileiros hipertensos de hoje em dia têm que comprar o Captopril de grandes empresas transnacionais.
Este triste exemplo inspirou Rafael Marques Porto, pós-doutorando do CAT (Centro de Toxinologia Aplicada), a dizer: “Você pode isolar e caracterizar substâncias com um valor enorme farmacêutico, farmacológico, e americanos e europeus estão aqui fazendo isso. Então, é importante que um grupo brasileiro comece a tomar conta disso”.
O CAT faz parte do Instituto Butantan e é reconhecido pela Fapesp como parte dos chamados dez Cepids (Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão) e busca aproveitar a enorme biodiversidade brasileira para descobrir toxinas cujos princípios ativos sejam úteis na feitura de medicamentos. Coordenado pelo professor Camargo, o CAT – Cepid vasculha tudo o que diz respeito a toxinas de venenos de diferentes animais, sejam eles insetos, bactérias, ou cobras. Rafael, por exemplo, trabalha no Laboratório de Química de Proteínas do Centro (comandado por Fernanda Portaro) e faz parte de um grupo que pesquisa as características de peptídeos presentes no veneno da jararaca.
O cientista explica que estes peptídeos podem ser inibidores da hidrolase, enzima que tem a propriedade de cortar proteínas e está presente em diversos processos que fazem parte dos vários estágios do envenenamento, como a hemorragia e a hipotensão, por exemplo. Esta enzima, apesar de presente em venenos, tem formas análogas no homem. Por isso, Rafael acredita que um peptídeo que se caracterize como inibidor da hidrolase certamente cumprirá o mesmo papel no organismo humano, sendo, assim, uma droga em potencial.
Várias frentes do conhecimento estão contribuindo para o trabalho. Daniel Pimenta é o responsável pelo espectômetro de massa, aparelho que auxilia o pesquisador a descobrir qual das moléculas de uma substância é a responsável pela ação de inibição de uma enzima, e como este processo ocorre. O Laboratório de Biologia Molecular do Centro está isolando os genes que geram as moléculas atualmente estudadas, e assim por diante. Também está sendo importante a participação do Laboratório de Toxinologia Molecular, coordenado pelo pesquisador-chefe Tetsuo Yamani, onde trabalham os pós-doutorandos Gandhi Batista, Marina Assakura, Fátima Furtado e Miriam Hayashi.
Rafael pretende procurar outros peptídeos que estejam envolvidos na inibição de outras enzimas, ligadas, por sua vez, a outras patologias que não a hipertensão. “A gente vai entrar numa espécie de um peptidoma, que seja, vamos analisar um repertório de peptídeos, proteínas pequenas”, diz ele.