ISSN 2359-5191

15/12/2008 - Ano: 41 - Edição Nº: 145 - Meio Ambiente - Instituto Oceanográfico
Golfinhos não são monogâmicos
Contrariando estudos e crendices populares, biólogo estuda relações comportamentais dos golfinhos entre si e afirma que os cetáceos não possuem o mesmo parceiro por toda a vida

São Paulo (AUN - USP) -Vários documentários, estudos e até textos divertidos que circulam pela internet afirmam que os golfinhos estão no grupo de animais monogâmicos do nosso planeta, ou seja, que possuem o mesmo parceiro sexual durante toda a vida e provável constituição de família. Mas, ao contrário do que se pensa, estudos mostram completamente o contrário: na verdade, não apenas os golfinhos, mas nenhuma espécie de cetáceo terá, no seu desenvolvimento, monogamia ou relação familiar entre seus iguais.

O biólogo Marcos César de Oliveira Santos, do Laboratório de Biologia da Conservação dos cetáceos e palestrante da Semana de Oceanografia da USP, explica a errada idéia sobre o comportamento sexual dos golfinhos. “Infelizmente, temos trabalhos em português, até feitos por brasileiros, dizendo que o boto cinza é monogâmico.” Marcos diz que esses estudos estimulam a visão “bonitinha” que temos dos golfinhos, tentando aproximá-los cada vez mais à moralidade humana. A grande capacidade de comunicação dos golfinhos, que envolve sons e tato, já é um atrativo para o ser humano “humanizar” esses animais. Já a monogamia, que teoricamente é imposta em nossa espécie apenas por estímulos sociais, não se encaixa nas relações entre os Sotalias, nome científico do boto-cinza, os famosos golfinhos.

“Ecologicamente e cientificamente, não tem sentido nenhum (dizer que golfinhos são monogâmicos)”. Entre as diversas explicações científicas que comprovam o fato está o dimorfismo sexual. Dimorfismo é a capacidade de diferenciação de machos e fêmeas com caracteres que não tenham a ver com o órgão sexual: os leões, por exemplo, possuem jubas, ausente nas leoas. O dimorfismo nas espécies animais serve para, entre outras coisas, a competição na hora da escolha do par. Uma leoa, por exemplo, dará mais preferência para o acasalamento com um leão que tenha a maior juba, enquanto que um pavão fêmea escolherá como companheiro aquele com o rabo mais bonito. No caso dos golfinhos, não há nenhuma característica que diferencie visualmente o macho da fêmea, e nem uma fêmea das outras ou um macho dos demais. Com o dimorfismo ausente entre os golfinhos, todos os exemplares da espécie são praticamente iguais.

Isso significa, inicialmente, que não há escolha rígida de par, o que acontece muito em espécies monogâmicas, que precisam escolher um companheiro muito saudável para acasalar por longo tempo ou até mesmo para a vida inteira (no caso das aves, onde há muito dimorfismo sexual, cerca de 90% das espécies são monogâmicas).

O segundo motivo mais gritante que desmistifica a teoria monogâmica é o tamanho dos testículos: na maioria dos machos cetáceos, e nisso inclui-se o golfinho, os testículos crescem demasiadamente na época de reprodução. Os golfinhos possuem, normalmente, testículos de dois a cinco centímetros. Na época de reprodução, o órgão aumenta cerca de 600% , chegando a 30 centímetros de tamanho e a pesar um kilo e meio. Essa mudança drástica representa competição espermática: quanto mais esperma tiver um golfinho, mais fêmeas ele terá a chance de copular. Basicamente, o “melhor” golfinho vai fazer os genes dele prevalecer, tentando acasalar com o maior número de fêmeas possível e gerar o maior número de filhotes. Essa informação é prova notável da inexistência de monogamia na espécie.

Segundo Marcos, a única espécie que poderia ser exceção à regra de que não há monogamia em cetáceos são as orcas . Casos de estudos de monogamia em orcas da Costa Oeste da América do Norte gerou cerca de 15 grupos de pesquisas. Ainda não há provas de que orcas sejam monogâmicas mas, se forem, uma grande explicação é que, além do cachalote, é o único cetáceo que apresenta dimorfismo sexual: nos machos, a barbatana dorsal chega a medir dois metros de altura, enquanto na fêmea elas quase não crescem. Além disso, as fêmeas são bem menores.

Até onde a ciência sabe, não existem casos de relações familiares nem monogamia em espécies de cetáceos. E, para isso, Marcos termina a explicação com uma piada: “Sei que todo mundo acha fofinho golfinho ser monogâmico, mas sinto informar que de ‘certinhos’ eles não tem nada”.

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