São Paulo (AUN - USP) - A falta de informação é a maior inimiga da relação entre humanos e cetáceos. Sem o conhecimento, pessoas com objetivo de salvar baleias e golfinhos encalhados colocam a vida dos animais e a própria em risco. Há, no Brasil, dois casos de acidentes envolvendo cetáceos. Um deles foi fatal.
Segundo conta César de Oliveira, pesquisador do Departamento de Zoologia da UNESP e palestrante da Semana de Oceanografia da USP, uma das principais ameaças aos animais marinhos são as operações mal realizadas de salvamento. “No caso de baleias ou golfinhos encalhados, um monte de gente vai na praia para tentar ajudar, bombeiros e policiais que não entendem do assunto se colocam no lugar de ficar no comando da situação e acabam atrapalhando”, comenta César.
Aquelas cenas solidárias de milhares de pessoas na praia, ajudando a desencalhar uma baleia, segundo César, é algo completamente errado e perigoso. “Pessoas leigas não podem ‘ajudar’ num desencalhe”, explica. “As vezes, amor de mais faz mal”. E um dos maiores perigos que se corre nesse tipo de atuação é ser acertado pela calda do animal. Tanto baleias quanto golfinhos possuem uma força absurdamente grande na calda, que usa para impulsionar o nado. Encalhados, eles tentarão balançar a calda para saírem de lá. “Se acertarem uma pessoa, mata”, diz César. Ele conta, inclusive, que presenciou um caso em que pessoas tentavam ajudar no desencalhe de uma baleia Jubarte. Um dos indivíduos levou uma caldal (como chamam quando a calda bate em alguém) e ficou seriamente ferido, quebrando quase todos os dentes e o esterno, osso responsável pela sustentação das costelas e clavículas.
Infelizmente, um dos motivos para o acidente foi o fato de não termos, no Brasil, uma política adequada de atendimento a encalhes. O primeiro procedimento ideal, explica César, seria interditar a praia e permitir apenas o acesso de biólogos especializados para remover o animal.
O outro caso de acidente ocorreu no Litoral Norte, o qual César presenciou e foi designado pelo IBAMA para organizar o caso. Havia um golfinho nadando perto das pessoas e muitos já estavam brincando com o animal: colocavam palitos de picolé no orifício respiratório do animal e latas de cerveja abertas foram colocadas em seu focinho. Um homem que estava na praia, bêbado, foi continuar a brincadeira tentando tirar o golfinho da água. Quando estava no raso, o golfinho tentou se debater para voltar ao fundo e bateu a calda na altura do estômago do homem que o carregava, provocando a morte deste. “Foi o primeiro acidente fatal envolvendo um cetáceo em ambiente natural no Brasil”, conta César. As pessoas, revoltas, quiseram matar o golfinho. Após receber alvará do IBAMA para cuidar do caso, César presenciou a migração do golfinho Tião (como era chamado) para outra praia, logo após o término do verão. R$ 80 mil foram doados de ONGS para a proteção do animal, que não conseguiu ser capturado, indo viver na praia de São Sebastião, onde surfistas já sabiam que não se deve nadar perto deles.
“Tem que tomar muito cuidado”, diz César, “Golfinhos tem o costume, entre eles, de se baterem e dar mordidas. É costume social”. Se o golfinho interage muito com humanos, por exemplo, é capaz de começar a ter as mesmas relações com as pessoas, como se nos reconhecesse como parte do grupo. Eles não sabem que machucam, porque isso é comum entre eles.
Segundo César, o que deve ser feito é, inicialmente, mudar a legislação sobre encalhes de cetáceos em praias, para depois passar a informação para o público leigo. “O homem que morreu, por exemplo, com certeza não sabia do risco que corria e nem do fato de que devemos nos comportar como convidados ao entrarmos no mar”, conclui o pesquisador.