São Paulo (AUN - USP) - O vírus do Papiloma – conhecido, nos humanos, por ter um importante papel no desenvolvimento de câncer no colo uterino – também é transmitido pelo sangue. Essa é uma das principais descobertas de estudos feitos pelo laboratório de genética do Instituto Butantan. "Sempre que existe câncer de útero, encontra-se associado ao vírus do Papiloma humano, chamado de HPV", explica o diretor do laboratório e diretor científico do Instituto Butantan, Willy Beçak. "Não quer dizer que toda mulher que tenha HPV tenha câncer de útero, mas toda mulher que tem câncer tem HPV, principalmente de dois tipos, o 16 e o 18", completa, destacando que há mais de 100 tipos do vírus. À longo prazo, os pesquisadores pretendem desenvolver vacinas por engenharia genética para combater o câncer de colo de útero.
Por meio de estudos com o vírus do Papiloma bovino (BPV), que é muito parecido com o HPV, descobriu-se que o vírus pode ser transmitido pelo sangue porque se abriga em um dos tipos de células sangüíneas, os linfócitos. Em laboratório, os pesquisadores inocularam sangue contaminado em bovinos sadios, comprovando a transmissão. O diretor do laboratório informa ainda que também são contaminados a urina, o sêmen, o leite e o colostro (primeiro leite). Entre os bovinos, os tumores mais comuns são os de bexiga e do aparelho digestivo, o que acarreta, em algumas regiões, em grandes perdas econômicas.
Cofatores
Outra pesquisa desenvolvido no laboratório estuda alguns cofatores que facilitam o desenvolvimento de um tumor. "Só o vírus per si, dificilmente dá um tumor se não tiverem outros fatores associados a ele", explica Beçak. Entre os bovinos, por exemplo, os tumores aparecem em maior freqüência quando o gado se alimenta de samambaia (o que ocorre em pastos com pouco alimento), pois esse vegetal têm substâncias cancerígenas e imunossupressoras, isto é, que inibem a formação de anticorpos.
Baseados nessas conclusões, os pesquisadores passaram a estudar a população humana da cidade de Ouro Preto (MG) – onde é comum comer-se samambaia –, para descobrir se as pessoas que ingerem a planta têm uma freqüência maior de tumores. "Nós já vimos que eles têm uma freqüência maior de anomalias cromossômicas, e células com anomalias cromossômicas são um prenuncio de células alteradas", informa o diretor. Além disso, os pesquisadores estão estudando mulheres gestantes que comem e que não comem samambaia, para analisar se a presença de substâncias da planta no sangue da mãe facilitaria o surgimento de anomalias cromossômicas nas crianças.
Vacina
Beçak explica que o passo seguinte será a tentativa de desenvolver dois tipos de vacina para o Papiloma, através da engenharia genética: uma preventiva, ou seja, se as crianças fossem vacinadas estariam protegidas; e outra com ação terapêutica, para pessoas já contaminadas com o vírus.
O vírus do Papiloma atinge certos tipos de tecido, alterando mecanismos de defesa das células e bloqueando os genes responsáveis por reparos genéticos ou eliminações de células transformadas (fenômeno conhecido como suicídio celular ou apoptose). O vírus tem, portanto, uma ação que faz com que a célula alterada permaneça no corpo, o que pode dar origem a uma população celular anômala e, consequentemente, a um tumor. Nos humanos, podem surgir, além do câncer de colo de útero, o câncer conhecido como condiloma (no pênis ou no reto) ou o câncer digestivo.
Até hoje, a mais conhecida forma de transmissão do Papiloma era pela relação sexual. Os estudos do laboratório do Instituto Butantan demonstram, no entanto, que o vírus também pode ser transmitido por contato sangüíneo. "Então, seria interessante que quando se previsse nas transfusões de sangue o controle para ver se o indivíduo tem AIDS, sífilis, doença de chagas, hepatite, que também fosse feito o teste para ver se o indivíduo tem o vírus do Papiloma", conclui Beçak.