São Paulo (AUN - USP) - Acidentes de navios em portos brasileiros, como o recente caso em Paranaguá, no Paraná, podem trazer sérios problemas ambientais e, apesar de ocorrerem com certa freqüência, apagado o fogo poucos se lembram das conseqüências do desastre para as regiões costeiras. O problema da regeneração desses manguezais e da forma como ela ocorre foram pesquisados numa tese do Instituto Oceanográfico da USP que busca entender esse processo que envolve, não só meio ambiente, como a vida de comunidades pesqueiras.
O estudo foi feito a partir de um acidente ocorrido em setembro de 1998, na ilha de Barnabé, na baixada santista, onde eram armazenados produtos líquidos para os navios do porto de Santos, e que afetou o mangue local. Um caminhão que carregava um produto inflamável pegou fogo e a combustão alastrou-se pela água do estuário (região em que a água do mar encontra-se com a do rio) atingindo, em parte, um bosque de mangue. Segundo Ricardo Palamar Menghini, a parte afetada diretamente pelo incêndio não conseguiu regenerar-se, e mesmo as partes internas do mangue, menos afetadas, sofreram deformações e tiveram dificuldades em se recompor.
Na parte do bosque de mangue que entra em contato com o estuário, a franja, ocorreu uma erosão de sedimentos, devido à morte das árvores que estavam ali. “A erosão causou um dano tão grande ao ambiente que impossibilitou a regeneração natural dessa área, e mesmo o plantio na região é complicado”, explica Ricardo. Nas partes do bosque que não foram afetadas diretamente pelo incêndio, mais internas, houve uma regeneração natural das plantas, mas mesmo aí ocorreram deformações. Uma análise das folhas dessas árvores, usada como padrão para medir a saúde do bosque, mostra a existência de deformações tanto no tamanho quanto na forma das folhas. As sementes das plantas de mangue, que caem das árvores já com embrião crescido, também apresentaram deformações.
Apesar desses resultados, Ricardo diz que não pode concluir que todas as deformações encontradas são decorrência desse acidente de 1998. “A ilha Barnabé sofre desastres ambientais desde 1954, com derramamento de petróleo, óleo diesel, tolueno, entre outros produtos químicos que contribuem para esse quadro”. Ainda não é possível ter uma resposta para a recomposição ou não do bosque. Segundo ele, esse tipo de resposta não é simples e não pode ser feita alguns dias após o impacto, como costuma ocorrer após os desastres.
Comunidade de pescadores
Próxima a essa região está a ilha Diana, uma comunidade de baixa renda que sofre diretamente com os altos índices de contaminação local. Se as plantas estão deformadas, isso se deve provavelmente a algum produto químico, esse produto vai para a água de estuário, é ingerido por algum peixe e pode acumular-se no organismo de quem consumir aquele peixe, as comunidades tradicionais ou a população de baixa renda que consome aquela pesca.
Hoje há vários projetos de regeneração que, para Ricardo, tornaram-se moda na baixada santista. Os projetos são desenvolvidos em regiões que não precisariam desse plantio, porque uma característica do manguezal é que, mantendo-se a entrada da maré aberta e existindo bosques maduros ao redor, a semente é transportada pela água e a regeneração ocorre naturalmente. “Gasta-se dinheiro numa intervenção desnecessária e deixa-se de utilizar essa verba para o grande problema social existente”, afirma Ricardo.
Mais informações: menghini@usp.br